Comissão da Verdade/condução coercitiva
A. C. Monteiro - Advogado
É bem verdade que o crime de desobediência é de natureza permanente, ou
seja, se prolonga no tempo e no espaço, podendo o agente ativo ser
preso e conduzido à presença da autoridade policial ou judiciária a
qualquer tempo.
Contudo, como se trata de crime de menor potencial ofensivo, o agente
ativo jamais poderá ser preso. Este deverá assinar um termo de
compromisso, comprometendo-se a comparecer perante o juiz, quando se
encontrar perante a autoridade policial e, em seguida, colocado em
liberdade, sob pena de restar caracterizado abuso de autoridade.
“In
casu”, quer me parecer com todas as vênias possíveis e imagináveis, que
a Comissão da Verdade presidida pelo Sub-Procurador da República
aposentado, Claudio Fonteles, não tem competência “ratione materiae”
para conduzir coercitivamente qualquer agente ativo que porventura deixe
de atender ao chamamento daquela comissão, conforme declarou
recentemente na imprensa, mormente porque a mesma está desprovida de
autoridade judicante, policial e parlamentar. Nesse último caso poderes
constitucionais são delegados às Comissões Parlamentares de Inquéritos
para a expedição de mandados para a condução coercitiva de testemunhas,
ofendidos etc.
Em assim procedendo
ou na tentativa de fazê-lo, incorre o funcionário público investido de
autoridade legal, em flagrante abuso de autoridade, podendo responder
penalmente e civilmente pelos atos praticados ao arrepio da lei.
Tal acontecendo ou na iminência de ocorrência desse tipo de
ilegalidade, alternativa não resta senão manejar a competente ação penal
constitutiva de “habeas corpus”, quer seja preventivo ou não, por
constrangimento ilegal, conforme previsão desenhada no Art. 5º, LXVIII,
da Constituição Federal.
Ademais, a Lei 11.690/08, diz com todas as letras que a condução
coercitiva somente pode ser feita pela autoridade policial ou judicial,
mesmo assim fartamente fundamentada e com lastro em procedimentos
devidamente legais e formais, hipótese que não se aplica à Comissão da
Verdade.
Igualmente, o crime de desobediência é delito praticado por particular
contra administração pública, jamais por funcionários públicos, estejam
eles ou não na ativa. “Ex vi legis”, doutrina e espancada
jurisprudência.
Aliás, aludidas afirmações por parte de quem deveria conhecer os
mandamentos legais que norteiam o ordenamento jurídico brasileiro, por
si só, a meu sentir, constitui uma ameaça ao direito de ir vir do
cidadão e por que não dizer um flagrante constrangimento ilegal àqueles
que se sentirem ofendidos, notadamente quando se pretende dar outro foco
à lei que instituiu a Comissão da Verdade, por mero capricho ideológico
e pessoal.
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