‘Apropriação indevida’, por Dora Kramer
PUBLICADO NO ESTADÃOA falta de limite entre o público e o privado ficou patente já nos primeiros acordes do governo do PT quando a estrela vermelha virou adorno dos jardins de Palácio da Alvorada, a fox terrier Michelle era transportada em carro oficial e 14 amigos dos filhos do então presidente Lula passavam duas semanas de férias em Brasília com direito a carona em avião da FAB, hospedagem no Alvorada, churrasco na Granja do Torto, tudo pago pela União.
De lá para cá ocorreram episódios bem mais graves de apropriação indevida da coisa pública, seja no campo da política partidária ou no terreno da ilegalidade comprovada.
Nada para o PT tem importância, todas as críticas a essa falta de cerimônia são vistas como manifestação de mesquinharia ou como evidências de conspiração.
Resultado: banalizaram-se os valores, derrubaram-se as divisas entre o certo e o errado, interditou-se o exercício do contraditório.
Ao PT, a Lula e companhia tudo passou a ser permitido porque ganham eleições e são vítimas de “preconceito”. Intocáveis, não se sentem obrigados a respeitar coisa alguma nem a pensar antes de falar.
Ao ponto de um ministro, Gilberto Carvalho, deixar de lado a liturgia do cargo e convocar às ruas a militância, avisando que 2013 será um ano “brabo” durante o qual “o bicho vai pegar”.
Pode-se alegar que o meio para a transmissão da mensagem foi o site do PT, agremiação de natureza particular. Mas a autoridade de um ministro é de Estado, delegada pela Presidência, sua voz tem abrangência, diz respeito a todo o País.
Nessa perspectiva, tal convocação em tom provocativo e de conteúdo intimidador é indevida e significa uma apropriação de prerrogativa pública para uso partidário.
Seria diferente se o ministro alertasse que o ano de 2013 será “brabo” tendo em vista o cenário difícil da economia. Mas, não, na visão dele, o “bicho vai pegar” devido às agruras de seu partido e à necessidade de preservar a mítica da figura de Lula.
Aflições que nem a todos brasileiros comovem e, portanto, não faz sentido que o ministro tome a parte pelo todo e confunda o Brasil com o PT.
É de se perguntar o que afinal de contas Gilberto Carvalho quis dizer com isso. Se ele fez uma ameaça, abusou do poder. Se o caso foi de pura bravata, perdeu uma excelente oportunidade de ficar calado.
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