J.R. Guzzo: Publicado na Revista Exame
A desgraça do governo Temer poderia ser até esperada, como uma questão de tempo, levando-se em conta as ligações que teve durante toda uma vida na política, seu entendimento do que é “governo” e seus anos a fio de participação na máquina pública. Mas sua agonia está sendo duplamente dolorosa. Nem tanto pelas consequências imediatas, pois é bastante provável, felizmente, que a orientação econômica de seu governo ─ um acerto acima de discussão ─ permaneça basicamente como está. O que incomoda, em primeiro lugar, é a constatação da incapacidade terminal dos homens públicos brasileiros, de “direita”, “esquerda” ou do raio que for, para gerir o país com um mínimo de responsabilidade, aptidão gerencial e valores morais. Isso está presente no Executivo, no Legislativo e no Judiciário. Não é uma questão de ideologia errada, pois quase ninguém aí tem uma ideia ─ não o que se possa realmente chamar de ideia. Trata-se, desastrosamente, de uma questão de hábito, de apego fanático a um sistema de exploração criminosa do Estado em proveito próprio e da recusa absoluta em mudar. Em segundo lugar, incomoda a maneira abusiva, oculta e cada vez mais suspeita, do ponto de vista legal, com que está sendo conduzida a guerra contra o presidente.
Foi estranhíssima, desde o início, a conduta do procurador-geral da República, Rodrigo Janot, e de sua equipe no Ministério Público nas acusações feitas contra Temer. Depois, foi ficando mais estranha ainda. No aspecto mais alarmante de seu conjunto de ações, continua incompreensível o fato de os donos da maior empresa privada do Brasil, a JBS, que confessaram uma massa de crimes capaz de lhes render dezenas de anos de prisão, caso condenados, ter sido presenteados pelo procurador-geral com um extraordinário perdão em relação a tudo que fizeram. Se as coisas continuarem assim, jamais serão julgados perante a Justiça brasileira pelos crimes que confessaram ─ jamais usarão, nem sequer por um dia, a tornozeleira da da prisão domiciliar. Em troca, ofereceram ao MP denúncias até agora contaminadas por todo tipo de dúvida ─ a começar por uma fita gravada de uma conversa entre Temer e um dos donos da JBS tecnicamente arruinada como prova e considerada imprestável. O ex-braço direito de Janot na PGR, até março último, trabalha hoje no escritório de advocacia que defende os empresários. Filmagens constantes da denúncia não foram feitas pela Polícia Federal, e sim por “uma equipe” da PGR. Não se sabe, também, por que os procuradores não fizeram nenhuma perícia das fitas gravadas, por que deixaram sob controle do delator uma parte crucial da operação e por que fecharam em menos de um mês, com a aprovação do ministro Edson Fachin, do STF, um acordo explosivo como esse. Não se sabe, na verdade, mais uma montanha de coisas. Resultado: a história toda encontra-se no momento debaixo de uma nuvem tóxica com a pior das aparências. Qui custodiet custodes? Quem vigia quem nos vigia?
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