por Gil Castello Branco Com O Globo
Dentre os tipos de comportamento antissocial, uns são narcisistas e ostentam os bens adquiridos ilegalmente, enquanto outros são discretos e ocultam o patrimônio. Todos, porém, são calculistas e administram os riscos. Se a Suíça aderiu à cooperação internacional contra a lavagem de dinheiro, mudam a grana para Cingapura, como teria sugerido a ex-presidente Dilma Rousseff em 2015 a Mônica Moura, mulher do marqueteiro João Santana. Se não convém serem vistos em público, encontram-se fora da agenda nos porões do palácio. Transformam propina em joias, lanchas, prédios, apartamentos, reformas, sítios...
Dentre os objetivos da Operação Lava-Jato, um dos mais relevantes é o de modificar a percepção de risco por parte dos corruptos. Até pouco tempo, o ganho era enorme e o risco, mínimo. De alguns anos para cá, na equação da corrupção a variável "risco" passou a ter um peso maior. Afinal, já são 141 condenações que resultaram em 1.428 anos de pena!
Mesmo após corruptos ilustres terem ido para a cadeia, ainda há encontros em pizzarias, de onde o "homem de confiança" de Temer saiu correndo com uma mala de dinheiro. Para Joesley Batista - o corrupto esperto e impune - até recentemente os políticos não estavam entendendo as consequências da Lava-Jato e a falência do sistema político. "Com a recuperação econômica, o brasileiro não iria mais para a rua, e eles poderiam abafar a Lava-Jato',' declarou Joesley. Não convém duvidar...
Quando a selva pega fogo, os bichos se unem. O petisco da moda em Brasília, saboreado por todos os líderes políticos, é a coxinha de mortadela. Em se tratando do combate à corrupção, há pelo menos três riscos iminentes: a eventual substituição do diretor-geral da Polícia Federal, Leandro Daiello; a sucessão do procurador-geral da República, Rodrigo Janot; e a reversão do entendimento do Supremo Tribunal Federal de decretar a prisão logo após decisão de segundo grau.
Em relação à Polícia Federal, no diálogo do senador afastado Aécio Neves com Joesley Batista, o tucano critica duramente o então ministro da Justiça, Osmar Serraglio, por não ter o controle da Polícia Federal. Aécio sugere uma seleção de delegados para receber inquéritos sobre determinados políticos. Na mesma linha, há vários governos, políticos e autoridades que tentam "adestrar" a Polícia Federal aos seus interesses, felizmente sem sucesso. No caso do sucessor de Janot, o sonho dos investigados é a designação de um novo "engavetador-geral da República" para amansar os meninos da força-tarefa. A estratégia, ao que parece, é plantar na mídia informações de que haveria insatisfação dentro dos órgãos com os atuais dirigentes, os quais estariam "prejudicando" a operação. Assim, a sociedade, equivocadamente, apoiaria as mudanças de comando, e o palácio passaria, enfim, a controlar a PF e o MPF, como desejam todos os corruptos envolvidos.
Quanto à prisão após condenação em segunda instância, o ministro Gilmar Mendes já se manifestou dizendo que o cumprimento da medida é possível, mas não obrigatório e defendeu que a corte reveja a decisão. Com a lerdeza da Justiça e sem a perspectiva de prisão, voltaremos à estaca zero.
Enfim, essas canetadas, se conjugadas, poderão afetar a Lava-Jato, reduzir o risco dos corruptos e favorecer a impunidade de Suas Excelências. No Brasil, lamentavelmente, os investigados podem designar os seus investigadores e aprovar leis que os protegem. O momento faz lembrar uma frase do poeta Jonathan Swift, que viveu na Irlanda no século XVII: "Como as coisas andam, a política nada mais é que corrupção".
extraídaderota2014blogspot
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