DAVID COIMBRA ZERO HORA - RS
Muita gente ainda não percebeu, mas o Brasil já foi em frente. O Brasil já mudou.
Eis duas das maiores qualidades desta terra banhada pela merencória luz da Lua – o Brasil é dinâmico e é dotado de uma capacidade que os psicanalistas valorizam muito: a de resiliência. Socialmente e economicamente. A economia do Brasil sempre cresce, a despeito dos governos. Não vá usar os últimos como exemplo, para não gerar polêmica vã; pegue um governo notoriamente ruim do passado, como foi o de José Sarney, com a inflação invencível, como Phelps e Bolt, e o nível de emprego caindo sem parar, como o Inter na tabela do Brasileirão. Pois, mesmo no tempo de Sarney, o Brasil cresceu.
Voltará a crescer ainda neste ano, depois do afastamento oficial de Dilma.
E ano que vem será bom.
Consigo sentir a reação dos brasileiros talvez porque observe à distância. É como aquele amigo que você reencontra de vez em quando e, se você está com o seu filho, ele se espanta:
– Como cresceu!
Estive no país em abril. Sorvi o clima tenso dos dias. Voltei em meados de junho, trabalhei em Porto Alegre, cobri a Olimpíada e, como todos os brasileiros, também suspirei de alívio porque tudo correu bem. Agora, nestes estertores de agosto, observando o rito final do impeachment, sei que é isso mesmo, apenas um rito, uma formalidade.
Li que os aliados de Dilma aconselham-na a "chorar e fazer chorar" em sua fala no Senado. Seria um discurso com eloquência suficiente para comover o país e mudar o rumo da história. Algo dramático e inesperado como a Batalha dos Aflitos. Ou como o julgamento de Frineia no tribunal de Tebas, 23 séculos atrás. Frineia era uma hetaira, espécie de prostituta de luxo. Seu advogado, Hipérides, encontrava-se na situação de José Eduardo Cardozo no caso de Dilma: já tinha esgotado toda a sua verve para salvar Frineia da morte. Não adiantava. Os severos juízes tebanos mostravam-se decididos a condená-la. Hipérides, então, resolveu tomar uma medida drástica. Chamou Frineia ao centro do tribunal. Ela foi. Era belíssima, a ponto de servir de modelo para o escultor Praxíteles, quando ele teve de fazer a estátua de Afrodite, a deusa do amor. Seu olhar triste comovia os homens. Chamavam-na de "clausigelos", ou "a que chora sorrindo". Com Frineia de pé em frente aos juízes, o advogado não falou mais nada. Apenas puxou-lhe a túnica com força, e ela ficou completamente nua. Ante o óóó dos vetustos tebanos, Hipérides juntou um só argumento:
– Pode um ser com esse corpo fazer o Mal?
Frineia foi absolvida.
Quer dizer: um tribunal pode se deixar impressionar por um truque de última hora.
Como será o discurso de Dilma? Terá o poder literário de um Churchill dizendo que não tem mais nada a oferecer, senão sangue, suor e lágrimas, ou jurando "We shall never surrender!"? Terá a carga passional de um Marco Antônio arengando aos romanos, com o manto ensanguentado de César nas mãos? Ou será a Dilma do improviso tragicômico da ode à mandioca?
É só o discurso de Dilma que me desperta a curiosidade no julgamento que começa hoje. Ela fez questão de falar. Deve estar preparando algo contundente. Quero muito ouvir. E depois, como a maioria dos brasileiros, seguir em frente.
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