por Fernão Lara Resende O Estado de São Paulo
Aécio, vá lá. Se for democracia “representativa”, quem tem de deseleger é quem elege.
Só que não é.
De quem “emana” o poder? De quem o levantar do chão. Por isso devolvem o
cara ao partido e ao Senado e partido e Senado podem dar-se o luxo de
manter o flagrado lá como se não fosse com eles.
E o Loures?
Prende o Loures!
Solta o Loures!
Por quê?
Porque o meritíssimo acordou com um humor diferente daquele com que foi
dormir (ou sabendo de alguma coisa que nós não ficamos sabendo ainda).
Se não cometeu um crime quando prendeu, cometeu quando soltou, e
vice-versa.
E aí?
Aí nada. Os “egrégios”, os “magníficos”, são exatamente aqueles a quem
se não interroga. Seus caprichos se derramam sobre nossas cabeças com a
força do destino.
A desculpa para não haver saída previsível para o processo judicial no
Brasil é o “garantismo”. O zelo para com o bem supremo da sua liberdade,
dirá, sempre no mínimo em 800 páginas, qualquer douta eminência togada.
Na prática, se as saídas não estão mapeadas no livro e os argumentos
são de modo a garantir sua ilegibilidade, tudo vai mesmo é da cabeça do
juiz. Arbítrio é a palavra. Que sempre pode ser revogado por outra
arbitragem... até da mesma cabeça de juiz, como acabamos de ver. Mas
esse “garantismo” que fecha a saída não vale na entrada. É tão fácil ser
empurrado para dentro quanto é difícil saltar para fora do nosso
labirinto judicial. Para isso basta o suposto em alguém. Somos todos
Josefs K. Ser libertado ou ser preso não depende do crime nem do tamanho
do crime. E as “penas” nunca valem o valor de face. Passado, presente e
futuro, tudo é sempre revogável.
Não tem preço o humor de um juiz nesse nosso Brasil medieval! É um trabalho para santos...
Michel Temer não conseguiu superar de bate-pronto a cultura de que é
produto. Apelou para a plateia errada. “Base aliada” com interesse em
reformas só existe mesmo aqui fora, e só se forem reformas pra valer.
Mas uma coisa é absolutamente clara: ele não lucra pessoalmente nada por
insistir no desmanche do imposto sindical, a mais velha das barreiras
contra o ingresso do Brasil na era das democracias representativas, e
numa reforma da Previdência que começaria a rebaixar os privilégios que
os donos do Estado se atribuem com suas leis para automatizar o
vampirismo espetando acessos perenes – “auxílios” ditos – nas veias do
Tesouro Nacional.
Não lucra nada, mas incorre na fúria dos “auxiliados”. E a
“privilegiatura”, unida, sempre saberá jogar mais sujo o jogo sujo. O
valor do prêmio é que explica tudo. Ele é exatamente do tamanho do que
nos falta. R$ 30,7 bilhões de déficit só na União, só no mês de maio. O
maior em 20 anos. O menor dos próximos 20 se nada mudar. E 8% a mais nos
gastos da Previdência, que já comem 57% do total que se arrecada – 46%
do produto interno brito (PIB) – só neste ano, em que a inflação não
passará de 3,5%.
Somos 61 milhões de inadimplentes. A concessão de crédito voltou a ser
negativa, depois de inversão para positivo a partir do segundo semestre
de 2016, quando se começou a falar de Brasil. A dívida bruta, de 51% do
PIB no início de 2014, foi a 72,5% em maio de 2017 e passará de 82% do
PIB até o fim do ano. O investimento público baixou de 3% em 2014 para
1,8% do PIB em 2016. Ha quase 14 milhões de desempregados e outro tanto
de subempregados. As cidades estão desmoronando. O que já não nasceu
favela está em via de abandono. O Rio das balas perdidas, o Rio das
crianças mortas, investe este ano 12% menos em educação e 34% menos em
saúde do que no ano passado. O salário médio cai todos os dias fora e
sobe todos os dias dentro do Estado, mas já se fala em aumentar
impostos.
E, depois, há a questão da “exemplaridade” que tanto sensibiliza o dr.
Barroso lá no Supremo Tribunal Federal. É ao PT que Temer sucedeu. É a
criatura do PT que Temer ameaçou...
Se é, portanto, de circunstâncias que se trata, estas nos dizem mais do
que o suficiente sobre a quem interessa o crime. Mas não fazem
desconfiar de nada à nossa central de produção de novelas políticas. A
especialidade, ali, não é fazer pensar, é fazer sentir. Induzir para
cima ou para baixo os polegares no grande coliseu
televisivo/cibernético. Nos seus enredos não existem problemas
brasileiros, só existem problemas de brasileiros. Mocinhos e bandidos.
Aplausos ou vaias. Todo o som e toda a fúria que a cenografia
audiovisual proporciona para uns, a enumeração rapidinha dos efeitos
colaterais que matam no fim daqueles anúncios de remédios baratos para
outros.
Qual é a regra que está errada? Qual é a regra que está faltando? O que é
necessário fazer para tornar certa e sabida a entrada e a saída do
labirinto judiciário? O que se pode e o que não se pode fazer nos
acordos de leniência, seja qual for o juiz, seja qual for o réu? Como
transformar a nossa selva institucional numa democracia? O que fazer
para tornar claro quem representa quem em cada Casa legislativa? Para
subordinar o representante ao representado? Para garantir que o povo não
tenha de engolir leis escritas para roubá-lo? Ou ficar sujeito a juízes
que se aliam ao crime? Como se faz isso lá fora?
Essa é a discussão de Brasil. Você sabe que não passa de briga de bandido quando é só de fulanos que se fala.
Bambu dá mais que chuchu na cerca nestes tristes trópicos. Não faltarão
flechas para tão poucos alvos escolhidos entre os 2 mil subornados da
delação da vez. Mas essas soluções de índio só nos porão mais próximos
da volta à caça e à coleta se e quando houver. Para se dar o luxo da
segurança de plantar para colher será preciso avançar pelo menos até o
século 18 do figurino institucional.
Não é o que está no nosso horizonte. Essa disputa que vem sendo
televisionada, na qual o nome do Brasil nunca é mencionado e a medicina
institucional moderna é zelosamente sonegada ao conhecimento do povo, é
exclusivamente pelo direito de nos herdar.
EXTRAÍDADEROTA2014BLOGSPOT
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