segundo Clóvis Rossi Folha de São Paulo
Pode ser que haja gente no PT que não concorde, como mostrou na quinta-feira (27) reportagem na Folha da sempre excelente Catia Seabra. Mas como o endosso foi dado pela presidente do partido, a senadora Gleisi Hoffmann, sou obrigado a tomá-lo como decisão partidária, até porque não vi nenhum voz discrepar em público.
Associar-se ao fracasso já é suficientemente grave para qualquer partido que queira ser governo, mas torna-se uma perfeita idiotia quando se conhece o caráter do governo que se está apoiando. Não é só uma ditadura, o que já seria brutal.
A "Economist" que está nas bancas acrescenta um segundo horror: rotula o governo Maduro como "thugocracy" ("gangstercracia" ou governo de gângsteres).
Gleisi e o PT não acreditam na revista britânica? Então, anote a informação de um esquerdista convicto, o ex-ministro do Planejamento do chavismo, Jorge Giordani. Segundo ele, do US$ 1 trilhão (R$ 3,13 trilhões) que o governo venezuelano recebeu durante o "boom" do petróleo na década passada, mais de US$ 300 bilhões (R$ 941 bilhões) foram roubados ou desviados.
É dinheiro capaz de transformar os roubos revelados pela Lava Jato em troco miúdo. O PT, já suficientemente enrolado na Lava Jato, podia poupar-se do vexame de atravessar a fronteira para chafurdar na lama do vizinho.
Há outro aspecto relevante nessa associação com o crime e o fracasso. É a incoerência apontada, por exemplo, pelo jornalista argentino Ernesto Tenembaum, que está no sítio Infobae, mas já foi do jornal esquerdista "Página 12":
"Que direito, por exemplo, tem Lula de criticar uma sentença judicial quando tolera que um aliado prenda milhares e assassine dezenas"? (Na verdade, já são centenas).
Se Gleisi não acredita em jornalistas, a não ser naqueles que só sabem bajular seu partido, que leia então um ícone da esquerda, o linguista Noam Chomsky, que sempre defendeu não só o governo Lula mas também os demais governos supostamente de esquerda que se instalaram na América Latina.
Eis o que disse Chomsky em recente entrevista à rádio "Democracy Now", que reproduzo na íntegra no trecho referente à Venezuela, inclusive com as falhas normais na linguagem oral:
"A Venezuela é realmente uma situação desastrosa. A economia depende do petróleo em grande –provavelmente em dimensão maior do que jamais no passado, certamente muito alta. E a corrupção, a roubalheira etc, tem sido extrema, sob –especialmente depois da morte de Chávez".
É a tal "gangstercracia" apontada pela "Economist".
Tem mais: "Se você olha para, digamos, o Índice de Desenvolvimento Humano da ONU, a Venezuela ainda está acima do Brasil". Consola-se Chomsky: "Então (por causa do IDH), há esperanças e possibilidades para a reconstrução e desenvolvimento. Mas a promessa dos anos iniciais foi significativamente perdida".
Combina com Chomsky a avaliação do jornalista Tenembaum: "Na Venezuela, ocorreu o que costuma acontecer cada vez que alguém sustenta que é necessário vulnerar as liberdades públicas para produzir uma transformação social: o único que se consegue é terminar com a liberdade e acentuar os problemas sociais".
Bingo. Alguns dados para Gleisi e o PT se informarem sobre os problemas econômicos e sociais:
1 — Cerca de 11,4% das crianças venezuelanas são subnutridas;
2 — A economia vai retroceder em 2017 pelo terceiro ano consecutivo, com o PIB caminhando para desabar 20,7% em relação a seu nível de 2014, fracasso que nem o desastre Dilma/Temer conseguiu produzir.
3 — A inflação deve atingir 1.700%.
4 — Pesquisa de três universidades sobre as condições de vida mostra que 82% dos lares venezuelanos vivem na pobreza, o que transforma o país no mais pobre da América Latina.
"Pela primeira vez na história, chegamos a 82% dos lares na pobreza", diz Ángel Oropeza, um dos membros do grupo que fez o estudo.
Antes de adular o regime venezuelano, Gleisi poderia ao menos ter se dado ao trabalho de ler recente manifesto de mais de 250 intelectuais e acadêmicos de esquerda no qual se lê, por exemplo:
"Não acreditamos, como certos setores da esquerda latino-americana, que devemos defender acriticamente o que é apresentado como um 'governo anti-imperialista e popular'. O apoio incondicional oferecido por certos ativistas e intelectuais não apenas revela cegueira ideológica mas é prejudicial pois, lamentavelmente, contribui para a consolidação de um regime autoritário".
Assina, entre outros tantos, o sociólogo português Boaventura de Sousa Santos, outro clássico na defesa e na propaganda da esquerda latino-americana.
Pois é, Gleisi, sua cegueira ideológica levou-a a reafirmar a sociedade com um fracasso autoritário. Você e o PT.
extraídaderota2014blogspot
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