CARLOS ARI SUNDFELD - Folha de São Paulo
O juiz Sergio Moro foi técnico no processo penal em que condenou o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva.
Era natural que a importância do caso e a atitude agressiva da defesa fizessem o juiz tomar cuidado no relato e análise do processo e dos fatos apurados.
A sentença saiu longa e bem elaborada, como esperado, e não deixou muito espaço para uma anulação por falhas apenas formais.
Houve absolvição quanto ao que, ironicamente, o ex-presidente havia chamado de "tralhas".
A OAS de fato pagou de forma oculta as despesas com o armazenamento.
E Moro não deixou de anotar que isso estava errado. Mas não bastaria para se falar em corrupção. É que não se demonstrou a ligação entre esses pagamentos e alguma atuação irregular de Lula como autoridade pública.
Também não ficou claro o caráter pessoal do benefício. Ao rejeitar essa parte da denúncia, a sentença de Moro acabou se fortalecendo contra o discurso da defesa, que durante todo o processo, vinha tentando desacreditar o juiz, chamando-o de político e parcial.
Mas houve condenação quanto ao tríplex. Qual a diferença? Para desqualificar a acusação de que fosse o dono do apartamento, Lula colocou ênfase no argumento de que não havia qualquer escritura em seu nome.
Sempre foi um argumento frágil, apenas formal, mas fácil de entender e muito útil para a militância.
Mas era previsível que o juiz não se impressionasse, até porque corruptos sempre ocultam com terceiros os bens que adquirem com seus crimes. Isso, aliás, é lavagem de dinheiro, outro crime.
Mas a base da condenação não é propriamente a fragilidade da defesa formal na questão da propriedade.
Lula também se defendeu dizendo que se limitara a visitar o apartamento como possível comprador, mas não tinha gostado do que viu.
Aí as inúmeras provas falaram mais alto, segundo a sentença: as relações da família de Lula com o apartamento ficaram comprovadas não só pelas testemunhas e documentos, mas também pelos detalhes da reforma personalizada.
É verdade que a demonstração de Moro impressiona, mas é claro que o recurso vai tentar chamar atenção do tribunal para outra leitura dos mesmos fatos. Aí serão outros juízes, outras cabeças.
O último ponto importante da sentença foi o exame da ligação entre o tríplex e o propinoduto –que, a partir de contratos com a Petrobras, teria sido montado pela OAS com o grupo político de Lula.
Há muitos elementos de prova quanto a isso, segundo a sentença.
O ponto mais delicado, em que o tribunal vai ter de se dedicar com equilíbrio, foi a conclusão quanto à liderança e o envolvimento de Lula.
Os executivos da OAS disseram que o tríplex foi descontado da conta da propina do PT. Moro levou isso em consideração na leitura de outras provas, que deram indicações no mesmo sentido. Mas é um ponto difícil, que o recurso vai atacar.
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