Deonísio da Silva:
Ditos populares, expressões e provérbios com números apresentam verdadeira obsessão pelo número sete.
Pintar o sete, bicho de sete cabeças, guardado a sete chaves, enterrado a sete palmos, as sete notas musicais, no sétimo dia Deus descansou da criação do mundo, os sete pecados capitais, os sete sacramentos, as sete maravilhas do mundo antigo, as sete cores do arco-íris, os sete dias da semana, os sete sábios da Grécia antiga, Branca de Neve e os sete anões, o gato tem sete vidas, as sete virtudes (três teologais e quatro cardeais), perdoar setenta vezes sete etc.
Alguns dos motivos de tais predileções não podem ser rastreados, uma vez que se perdem na noite dos tempos, antes da escrita. Embora provavelmente tenham sido depois registrados, é preciso lembrar que a memória da humanidade ardeu muitas vezes no fogo de guerras e de outras intolerâncias, quando bibliotecas, museus e outros sacrários de nossas lembranças foram queimados sem misericórdia nenhuma.
No ambiente bíblico, o número sete comparece aleivoso e sutil.
Mas por que o sete é conta de mentiroso? Provavelmente o ditado, que veio da tradição hebraica, deveria ter outra redação: sete é a conta do Mentiroso, uma vez que Mentiroso, variação de Caluniador e Acusador, é um dos cognomes de Satanás.
Em suas contas, o Mentiroso dá deslavada preferência pelo sete. Mateus e Lucas, dois esplêndidos narradores, fazem este registro, cada um deles a seu modo: “Quando é expulso, um espírito imundo volta com outros sete espíritos piores do que ele, e passam a viver ali. E o estado final daquele homem torna-se pior do que o primeiro”. Bem, neste caso são então oito.
Os evangelistas Marcos e Lucas, quando se referem a Maria Madalena, não deixem de recordar: “aquela de quem Jesus expulsou sete demônios”. Isto jamais foi esquecido e é lembrado inclusive no Sábado de Aleluia, talvez exalando um certo ressentimento por Jesus ressuscitado ter aparecido primeiramente para uma mulher e não para um deles.
Há um contexto notável e complexo no episódio da samaritana que encontra Jesus sentado à beira do poço onde a mulher vai buscar água. Ela tivera cinco maridos, vivia com um homem que não era o seu marido, e uma atmosfera amorosa com o Mestre dá a entender que ele poderia ser o sétimo.
Ao estudar esta reiterada presença do sete nas expressões, João Ribeiro, estudioso intuitivo de nossas frases e expressões curiosas, destaca que o mentiroso costuma ter obsessão extrema com a certeza. E, assim procedendo, dá pistas de que sabe que está mentindo e por isso precisa reafirmar tanto o que diz.
O remédio, verdadeiro antídoto para o excesso de afirmações e negações, é , porém, um só, de acordo com a recomendação de Mateus 5, 37: “Seja o teu sim, sim. O teu não, não. O que passar disso é do Maligno”.
Maligno é o outro nome do Mentiroso. Pois mentir faz um mal desgraçado, não apenas a quem ouve a mentira, mas sobretudo a quem a profere. Ainda que profira, não apenas sete ou setenta vezes, a recomendação bíblica é perdoar setenta vezes sete, isto é, sempre.
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