Reinaldo Azevedo: Folha de São Paulo
Michel Temer está há uma semana à frente do governo. Há menos
turbulência do que eu imaginava. Mas também há mais erros do que
recomenda a prudência. Já chego lá. Antes, terei de voltar à cartilha.
Não! A legalidade e a legitimidade da posse e do exercício do mandato de
Temer não são matéria de gosto, de opinião, de lado e outro lado, de
pluralidade. Ou bem se acatam a Constituição e a lei ou bem não. Se não,
há dois caminhos. Um deles é a luta política para mudar os diplomas
legais; o outro é a luta armada.
O nhe-nhe-nhem supostamente antigolpista não é uma das vozes da
pluralidade, mas o eco de um atraso, próprio de quem repudia a
democracia. Agora ao ponto.
Temer acertou no essencial, e o melhor, nesses poucos dias, foi seu
discurso inaugural. Ouviu-se de novo a voz da institucionalidade, não de
uma facção, como virou regra nos últimos 13 anos e pouco.
O presidente levou para o primeiro plano da política o rombo nas contas
públicas –e é obrigatório que faça um pronunciamento à nação dando o
estado das artes–, a necessidade de empreender reformas, especialmente a
da Previdência, e acena com privatizações. No Itamaraty, José Serra
evidenciou a guinada em favor da racionalidade.
Mas também se errou mais do que o razoável. A transformação do
Ministério da Cultura numa divisão do MEC, ainda que se aumentem os
recursos para o setor, foi a crônica do berreiro anunciado. Antevi, em
texto, a balbúrdia. Adverti.
Artistas atraem holofotes. É da profissão.
Boa parte dos políticos brasileiros vive na era pré-redes sociais. Eles
ainda não se acostumaram à velocidade dos fatos e dos boatos que viram
fatos. Uma fala, um deslize, um pensamento solto... E o mal está feito.
Por que diabos Ricardo Barros, ministro da Saúde, tem de dizer que acha o SUS muito grande se,
efetivamente, não há e não haverá em prazo alcançável a olho nu
proposta para encolhê-lo? O que vislumbra quando afirma que pretende
debater com a Igreja a questão do aborto, esgrimindo números que são
escandalosamente falsos a respeito?
As considerações do experiente Henrique Meirelles (Fazenda) sobre a idade mínima para a aposentadoria faziam
sentido num tempo em que governos lançavam balões de ensaio para testar
a reação da opinião pública, que demorava até se plasmar numa opinião.
Hoje, a especulação é logo tomada por uma intenção, e, antes que o
governo possa respirar, vê-se obrigado a recuar da decisão que nem
tomou.
Por mais conciliador que seja Temer, e isso é bom, é evidente que não pode permitir que alguém com a biografia de André Moura (PSC-SE) seja
líder do governo na Câmara. A rigor, esse senhor tem é folha corrida:
réu em três ações penais no STF, investigado em três inquéritos –um
deles sobre tentativa de homicídio– e condenação por improbidade
administrativa em Sergipe. Se o tal "centrão" veio com o fato consumado,
eis uma boa hora de dizer "não".
André Moura não pode ser o representante na Câmara de um governo que só
se instalou porque a titular do que caiu cometeu crime de
responsabilidade. É uma questão de... responsabilidade! E não me venham
com a história de que a política é a arte do possível. Se Moura é o
possível, melhor a gente brincar de outra coisa.
Urge que Temer imponha o silêncio obsequioso aos ministros, que só
poderão falar sobre decisões já tomadas. E também tem de deixar claro
que não será refém daquelas forças com as quais sua antecessora não
conseguia nem governar nem romper.
extraídaderota2014blogspot
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