por Miriam Leitão O Globo Com Marcelo Loreiro
Qualquer família ou empresa que tivesse de consultores o diagnóstico de
que “gasta mais do que pode e gasta mal” estaria a caminho da
bancarrota. O Brasil recebeu do Banco Mundial este atestado junto com
uma série de números e propostas. Ele pode recusar todas as sugestões.
Mas é fundamental admitir que o país está arruinado e que isso piorou
nos últimos anos. A realidade precisa ser encarada.
O Banco Mundial já fez estudos como esse, de análise do gasto público,
em diversos países e a radiografia é sempre importante para orientar
escolhas. Mesmo que seja a de deixar tudo como está e depois pagar o
preço, ou procurar um resultado parecido por outros meios. Só não é
possível ignorar os dados. Eles mostram que de 2012 para cá a dívida
pública saltou de 51% do PIB para 74%, e desde 2015 o governo gasta 8%
do PIB a mais do que arrecada. As sugestões feitas, caso aplicadas,
gerariam uma economia de 7% do PIB até 2026.
Se todo esse gasto estivesse alavancando o crescimento, alguém poderia
dizer que há mérito porque mais tarde o país aumentaria a receita. Mas
não. Estamos cavando mais fundo o poço no qual caímos. E para tornar a
sociedade brasileira mais injusta.
Na Previdência, os 20% mais ricos ficam com 35% do que é pago; os 40%
mais pobres, com 18%. Os subsídios às empresas custaram 4,5% do PIB em
2015 e, segundo o banco, não há evidência de que impulsionaram a
produtividade e o emprego. Na verdade, é pior. Esse dinheiro todo foi
transferido a empresas e houve queda do emprego e da produtividade.
Alguns desses programas nos causaram embaraço internacional, como o
Inovar-Auto. E as montadoras estrangeiras já estão de novo bajulando o
governo para recriar o mesmo programa, com outro nome, até 2030.
O Brasil gasta mais em Educação que a média dos países da OCDE, em
percentual do PIB. O aumento foi rápido na última década. A questão é a
eficiência. O desempenho avançou, mas a um ritmo menor do que o
necessário. As matrículas de curso superior triplicaram nos últimos 15
anos, e apenas um quarto delas é atendida por universidades públicas.
Dos oito milhões de universitários, dois milhões estão nas faculdades
públicas. A despesa com universidades federais saltou 7% em termos reais
e as matrículas aumentaram 2%. Cresceu a presença de estudantes pobres
no ensino superior, mas a participação ainda é pequena. Em 2002, 4% dos
estudantes eram dos 40% mais pobres, agora são 15%. Em universidades
públicas, 20% dos estudantes estão entre os mais pobres. É um avanço.
Porém, 65% dos alunos estão entre os 40% mais ricos.
Por isso o Banco Mundial sugeriu cobrar pelo ingresso. E cobrar de
maneira diferente, dando subsídios maiores aos mais pobres. “O ensino
superior pode estar perpetuando a desigualdade brasileira", diz o
estudo. A sugestão é cobrar dos mais ricos, financiar quem não puder
pagar, e dar bolsa integral para os mais pobres. O sistema universitário
público continuaria, mas receberia parte do seu financiamento dessa
forma de tarifa. É um assunto tabu, claro, mas por que não discutir?
A transferência de dinheiro para empresas aumentou 50% entre 2006 a
2015; saiu de 3% do PIB para 4,5%. O aumento aconteceu no governo
petista, que se define como de esquerda. O ideário da esquerda, como se
sabe, é a redução das desigualdades. Essa política faz o oposto. Pior, a
maior parte do dinheiro para as empresas não passa pelo Orçamento. É
menos transparente. A parcela mais relevante é dada através de desconto
no pagamento de impostos, com programas como o Simples, a Zona Franca de
Manaus, a desoneração da folha, o Inovar-Auto e o Programa de
Sustentação do Investimento. O crédito subsidiado para capitalistas,
através de bancos públicos, custou 1,2% do PIB em 2015, mais do que todo
o gasto com universidades federais. E se era para sustentar o
crescimento, fracassou porque o país entrou na pior recessão da nossa
história.
Ontem, o que o Banco Mundial divulgou foi, na verdade, o resumo de
estudos. As 150 páginas formam apenas o sumário executivo. O Banco
soltará avaliações setoriais aprofundando as análises e propostas em
cada área. Pode-se ignorar tudo ou encarar a realidade de um país que
gasta mais do que pode e ainda desperdiça. Mesmo que não sejam os
caminhos sugeridos, alguma solução o Brasil precisa encontrar para esse
impasse nas contas do governo.
extraídaderota2014blogspot
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