Igor Gielow: Folha de São Paulo
Nos fumos decorrentes do incêndio nas fundações políticas brasileiras,
em curso livre desde 2013 mas de origem bem mais distante no tempo, uma
das poucas coisas discerníveis foi a ascensão do fator Lava Jato como régua para a elegibilidade de um candidato.
Se você duvida, veja Aécio Neves. De líder inconteste do tucanato em
2014, quase eleito presidente com 50 milhões de votos, aplaudido por
onde passava, o senador mineiro após ser gravado no caso JBS parece um
daqueles robozinhos que monitoram o que sobrou da usina nuclear de
Fukushima -radioativo ao ponto da inutilidade, no caso eleitoral.
Ressalta-se, claro, o caráter eleitoral, já que politicamente ele segue bem ativoe
ajudando a construir o dissenso que ameaça trincar o PSDB de vez. A
marca de ferro quente da Lava Jato, de forma justa ou não, seguiu firme
como selo de qualidade para a embalagem de candidatos.
Voltemos ao novembro de 2017, com o governo Temer aparentemente com sua
vida garantida até o fim. Como em qualquer discussão política nos dias
de hoje, o campo está dividido em duas leituras:
1 - A sangria citada por Romero Jucá sendo
estancada por uma combinação funesta de revisões judiciais no STF,
trocas de comando no Ministério Público Federal e na PF, além do
estrangulamento financeiro de operações. O acordão é pluripartidário:
vai do PT de Lula, o magnânimo que perdoa golpistas, ao PMDB que namora o
partido do qual foi algoz. Para completar, há fastio popular evidente
com a sucessão de escândalos.
2 - A Lava Jato ganhou uma organicidade que a torna impenetrável. Como é
uma hidra com muitas cabeças, mesmo o corte de algumas das principais
não conseguirá ao fim impedir que ela siga seu curso. A infindável
dissecação do cadáver do Rio após sucumbir à turma de Cabral seria prova
cabal disso, além dos exemplos pontuais do PT, de Aécio e companhia.
Uma delação mais substanciosa é capaz de atomizar nomes estabelecidos há
décadas.
Como é dispensável explicar, misture as duas concepções, bata e coe os
exageros e imprecisões. Há verdade num enunciado que una tudo isso, mas a
fala do novo diretor da PF, Fernando Segovia, sapecando críticas ao
Ministério Público e dando o benefício da dúvida à mala do caso JBS
atiça de sobremaneira os aderentes da primeira explicação.
Segovia foi infeliz, para ser gentil com o doutor. No ambiente atual,
sua fala equivaleu a um agrado ao chefe. Não que estivesse exatamente
errado: se tem uma coisa que ajudou a aplicar hemostáticos nas feridas
abertas pela Lava Jato foi justamente ocomportamento açodado, novamente apelando à gentileza, de Rodrigo Janot. Mas é preciso ressaltar que a mesma PF corroborou a conclusão da PGR no caso, o que pode sugerir divergências ainda inauditas.
Assim, será preciso acompanhar os próximos passos da Lava Jato para
saber se a resultante das duas sentenças acima está pendendo mais para
um lado ou mais para outro. Mas é possível inferir algumas coisas, em
especial se as pesquisas nas mãos dos bruxos do marketing que ressaltam a
força da marca Lava Jato e/ou Ficha Limpa estiverem corretas.
Duas se sobressaem, dado o atual cenário desértico de lideranças do
campo governista e adjacências. A primeira é imediatista: a busca pela
novidade com "punch" eleitoral, um esforço especulativo que vai de Luciano Huck a João Doria fora do PSDB. A segunda é a volta do balão de ensaio Joaquim Barbosanuma composição com Marina Silva em sua vice.
As combinações são todas muito diferentes, em especial porque só tempo
de TV, Fundo Partidário e alianças estaduais são infalíveis como armas
para um novato.
E PPS, PSB e Rede não os têm, para ficar na leitura simplória. Mas e se
algum dos nomes no mercado disparar para uns 15% no começo do ano? A
máquina se adapta.
Enquanto isso, Geraldo Alckmin enfim se mexe em público, como a visita ao feudo dos Campos no
fim de semana provou. Se consolidar o PSDB, incerto mas provável, será
um polo de atração grande -caciques da sigla já contam algo como quase
10 minutos mesmo sem o PMDB no barco. E parece algo imune à Lava Jato,
já que as citações laterais ficaram por isso até aqui.
O que parece líquido é: com ou sem sangria, a Lava Jato segue eleitora importante em 2018.
extraídaderota2014blogspot
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