por Fernando Dantas O Estado de São Paulo
A atual recessão caminha para ser a pior da história econômica documentada do Brasil, com a queda do PIB devendo atingir quase 9% no acumulado entre o segundo trimestre de 2014 e o quarto de 2016. Na recessão do início dos anos 80, na esteira da crise da dívida externa, a queda acumulada do PIB foi de 8,5%. Já entre o final do governo Sarney e o primeiro trimestre de 1992, no vácuo do plano Collor, a economia recuou 7,7%.
A taxa de desemprego do trimestre até dezembro de 2016, de 12%, é com certeza a mais alta desde pelo menos o terceiro trimestre de 1993. Questões metodológicas, referentes à introdução recente de uma nova pesquisa de emprego, a Pnad Contínua, ainda impedem uma comparação do desemprego atual com o da recessão entre 1981 e 1983.
Mas um aspecto singular vem chamando a atenção dos pesquisadores na atual crise do mercado de trabalho: hoje, o emprego está caindo bem mais do que a renda, quando se compara com as recessões das últimas décadas.
No último trimestre de 1999, por exemplo, a renda média do trabalho foi 10,5% inferior ao mesmo período de 1998. Já o segundo trimestre de 2003 registrou um recuo da renda média, em relação ao mesmo trimestre de 2002, de 11,4%. Estes foram os picos de queda trimestral da renda média, em relação ao mesmo período do ano anterior, desde o terceiro trimestre de 1993.
Em comparação, ao longo de toda a atual recessão, o maior recuo trimestral da renda média do trabalho foi registrado de abril a junho de 2016, com queda de 4,3% ante o mesmo trimestre de 2015. Como se vê, uma queda de menos da metade das ocorridas em recessões bem menores que atual.
Uma situação bastante diferente se revela quando o objeto da análise é a população ocupada (PO), isto é, todo mundo que está empregado. De 1993 a 2015, praticamente não se registram recuos trimestrais (sempre na comparação com o mesmo período do ano anterior), com exceção de 1996, quando houve um recuo máximo de 1,5% entre abril e junho, num momento em que a renda subia.
É interessante notar que não houve nenhuma queda da população ocupada na crise de 2002 e 2003, nem durante o forte impacto da crise global em 2009.
Na atual recessão, entretanto, a população ocupada recuou nos seis últimos trimestres, chegando a um pico de queda de 2,5% entre julho e setembro de 2016.
José Márcio Camargo, economista da PUC-Rio e da gestora Opus, acha que a explicação do fenômeno é o salário mínimo, que subiu muito em termos reais ao longo das últimas décadas.
Para ele, os tempos de bonança da era Lula fizeram com que muitas empresas ficassem dispostas a pagar salários mais altos para uma mesma ocupação, e por isso a elevação do salário mínimo foi absorvida enquanto o desemprego continuava caindo. Agora, porém, as empresas não estão dispostas a pagar tanto, e o salário mínimo ficou muito elevado em relação a diversas ocupações, levando a demissões e à redução de postos de trabalho.
Em relação à queda menor da renda agora, Camargo considera que o grande recuo da inflação em 2016, comparada à de 2015 (6,3% contra 10,7%) pode ter poupado o salário real, já que os reajustes olham sempre para a inflação passada.
Outra possível explicação é que a queda na ocupação esteja se dando em trabalhos de baixa remuneração. Assim, quando esses baixos salários saem da conta, a renda média cai menos do que cairia se o desemprego estivesse atingindo as remunerações mais altas.
Os economistas Bruno Ottoni e Tiago Barreira, do Ibre/FGV – que estimaram retroativamente a Pnad Contínua até setembro de 1993 –, iniciaram uma investigação sobre as causas do recuo relativamente menor da renda, comparado ao aumento do desemprego, na atual recessão. Por enquanto, seus resultados indicam que a hipótese de queda dos empregos de baixa remuneração é pouco provável.
José Márcio Camargo, da PUC-Rio, acha que a explicação é o salário mínimo
*é colunista do Broadcast e consultor do Ibre/FGV
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