O Estado de São Paulo José Nêumanne:
Há uma aparente contradição em termos no noticiário da semana passada.
De um lado, sinais positivos começam a aparecer na economia, tornando o
otimismo possível, ainda que com cautela. De outro, a pesquisa MDA/CNT
flagrou a continuação de um vertiginoso desabamento do apoio popular ao
governo que o promove.
“Devemos ter crescimento neste primeiro trimestre. O ponto da virada
parece ter sido em dezembro”, disse o secretário de Política Econômica
do Ministério da Fazenda, Fabio Kanczuk, a Adriana Fernandes, do Estado.
Nas contas do secretário, a reação aparece no desempenho do
agronegócio, com uma safra recorde, o que não é novidade para ninguém,
de vez que, apesar da tolerância do Estado brasileiro com o Movimento
dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) e outros similares, o setor
continua sendo nossa galinha dos ovos de ouro. Mas, para surpresa geral,
a alta burocracia da Fazenda garimpou boas novas na normalização dos
estoques da indústria automobilística e no aumento do consumo, sobretudo
em hiper e supermercados, para alavancar os bens não duráveis. A equipe
econômica conta com a tendência de aumento de preços no mercado
internacional de minério de ferro e a recuperação da construção civil
por causa das medidas recentes de ampliação do programa social Minha
Casa, Minha Vida. O Fundo de Garantia do Tempo de Serviço também entra
na lista, seja por causa da elevação para R$ 1,5 milhão do limite para
compra da casa própria, seja pela injeção esperada de R$ 30 bilhões no
mercado com a liberação de suas contas inativas. A manchete de capa do
caderno de Economia & Negócios do Estado de sábado – Brasil registra entrada recorde de investimento estrangeiro em janeiro – pode prenunciar, além da rima, uma solução, parodiando o verso de Drummond.
Oxalá a virada, datada em dezembro último, não signifique que a economia
possa ter capotado, mas que tenha chegado ao fundo do poço, a ascensão
depois da queda. Aleluia!
O que, então, aconteceu nos últimos dias para a sociedade, em vez de
estar aliviada com os bons indícios, ter ficado aborrecida com o
governo, a ponto de manifestar o desagrado com este, caindo de 14,6% em
outubro para 10,3% agora? Ou seja, levando em conta a avaliação mais
recente da mesma pesquisa, o substituto está 0,9 ponto porcentual abaixo
da última avaliação da antecessora, à época do desfecho do processo do
impeachment dela, qual seja, de 11,2%. Mais preocupante ainda para o
atual presidente, e seus aliados do PMDB e do PSDB, é que, ao contrário
do que seria de esperar depois do massacre do Partido dos Trabalhadores
(PT) nas urnas, Lula subiu na preferência popular para 30,5% dos
cidadãos.
A 19 meses do pleito eleitoral, os números relativos à intenção de votos
são, na prática, desprezíveis. Eles revelam, entretanto, enorme
desconhecimento da massa acerca da absoluta responsabilidade do
ex-presidente pela crise que levou o País à quebradeira das empresas, ao
desemprego recorde de 12 milhões de trabalhadores desocupados, à queda
da arrecadação e a todas as consequências nefastas de 13 anos, 5 meses e
12 dias de desgovernos federais petistas. O descompasso entre a
realidade e a impressão popular é explicado pelo talento de comunicador
do ex-dirigente sindical, posto em confronto com o amadorismo
injustificável da comunicação na gestão de um governante que pretende
ser reconhecido como “reformista”.
Esse profundo e evidente paradoxo poderá, de um lado, prolongar o
calvário da falta de credibilidade de Temer e, de outro, servir para
realizar as pretensões de volta ao poder do “sapo barbudo” de Brizola.
Desde o começo a atual gestão padece de uma esquizofrenia institucional
aguda: a respeitável equipe de técnicos dá duro para sanear e
reconstruir a economia, enquanto a banda podre de políticos faz o diabo
para escapar da cadeia.
O presidente faz juras de fidelidade ao inédito processo de depuração,
que tenta dar cabo ao conúbio entre gestores corruptos da República e
empresários que dilapidam o patrimônio público e desmoralizam a
democracia, mas age no sentido oposto. Governa de joelhos para o País
oficial e de costas para o Brasil real.
Lula, Dilma e o PT prometiam “mudar tudo o que está aí”, mas levaram aos
mais sórdidos exageros a malversação do erário. Isso explica por que o
petista Tarso Genro disse ao juiz Sergio Moro que sua grei pratica o
caixa 2, crime nocivo às finanças públicas e à competição entre
empresas, sem a qual o capitalismo perde a razão de ser. Delatado na
Lava Jato como receptador de R$ 7 milhões de propinas da Odebrecht, o
ministro da Indústria (!), Marcos Pereira, do PRB do bispo Edir Macedo,
confessou, candidamente, que pediu doações para a campanha de seu
correligionário Marcelo Crivella. O uso do cachimbo entorta a boca e, no
caso, também a ética da fé que ele diz seguir – dos dez mandamentos de
Deus, o que proíbe furtar.
Temer indicou e dispensou do expediente seu ministro da Justiça, durante
o motim da PM capixaba, que resultaria em 149 mortes, para ocupar uma
vaga no Supremo Tribunal Federal (STF). Ele foi acusado de plágio, o que
implica falta de notório saber e de reputação ilibada, e pilhado
“simulando” sabatina em festa numa chalana, regada a champanhota
flutuante. Mas nada abalou suas pretensões ao posto.
O presidente conseguiu ainda do amigo decano do STF autorização para
blindar outro amigão das garras da primeira instância. E o abrigou à
sombra da mesma Suprema Tolerância Federal em nome da prerrogativa de
foro, a mais hipócrita violação da igualdade de todos os cidadãos
perante a lei que se pode imaginar em qualquer Estado de Direito.
Diante disso, resta-nos rezar para a banda sã da economia prevalecer,
antes que a banda podre da política a afunde no lamaçal da safadeza
geral em que estamos atolados.
extraídaderota2014blogspot
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