por Carlos Alberto Di Franco
Impressiona-me o crescente espaço destinado à informação negativa. A autoestima do brasileiro está lá em baixo. Nós, jornalistas e formadores de opinião, contribuímos para essa visão sombria quando ficamos reféns de pautas superficiais. A vida é feita de luzes e sombras. É preciso mostrar as chagas. Mas também é necessário iluminar a cena.
Cerca de 70 milhões de brasileiros com 16 anos ou mais deixariam o Brasil se pudessem, mostrou recente pesquisa Datafolha. O número representa 43% da população total do País. O porcentual chega a 62% quando são consideradas somente as pessoas que têm de 16 a 24 anos. Ao todo, 19 milhões de jovens afirmam que se tivessem opção sairiam do Brasil.
Entre os fatores que explicam o desejo estão a maior facilidade para se mudar e a frustração com o País. O êxodo, brutal no curto prazo, não significa uma ruptura afetiva com o Brasil. Em médio prazo, o País pode ganhar profissionais mais bem formados.
A pesquisa, no entanto, é um soco em todos nós. Que Brasil estamos ofertando às gerações que nos sucedem? Os problemas estão gritando na nossa frente: corrupção, crise econômica e perigosa agonia da política. Mas o pior legado, de longe, é a morte da esperança. O jornalismo de catástrofe é o grande propagador das fake news. Mostra um País em lá menor e oculta o Brasil que madruga, trabalha, empreende e dá certo.
É preciso recuperar o equilíbrio entre a informação de denúncia, urgente e necessária, e o jornalismo construtivo. É o que farei neste breve comentário. Vou focar num serviço público de qualidade: o Poupatempo.
O Programa Poupatempo, criado em 1997 pelo então governador Mário Covas para facilitar a vida dos cidadãos, completou 20 anos com índice próximo de 100% de aprovação dos usuários (98,3% de ótimo e bom na última pesquisa anual divulgada em março deste ano). Das 72 unidades, 24 tiveram 100% de ótimo e bom e 20 tiveram 99%.
Desde a sua fundação, o Poupatempo prestou mais de 580 milhões de serviços; o número é mais do que o dobro da população total do Brasil e 12 vezes a do Estado de São Paulo. Este ano, o Poupatempo foi eleito pelo quarto ano consecutivo o “Melhor Serviço Público de SP” pelo instituto Datafolha.
Ao completar duas décadas, o Programa Poupatempo passa por uma verdadeira revolução tecnológica, buscando o caminho trilhado pelos bancos brasileiros, ou seja, criando canais eletrônicos de atendimento que deem mais comodidade a quem precisa dos seus serviços, dispensando o cidadão da necessidade de deslocamentos. Com a tecnologia, muitas questões já podem ser resolvidas por aplicativos ou pela internet. Isso não beneficia somente o público, mas também o governo, que pode usar os recursos dos impostos com mais eficiência.
Uma inovação importante que vem sendo adotada nos últimos anos é o agendamento prévio para atendimento, que evita filas, garante conforto aos usuários e funcionários e ainda economiza recursos públicos - evitando períodos de superlotação ou ociosidade da máquina pública.
Os agendamentos podem ser feitos pelo portal na internet (www.poupatempo.sp.gov.br), onde os cidadãos também encontram alguns serviços que podem ser concluídos virtualmente, sem necessidade de ir a uma das unidades do Poupatempo. Para facilitar os agendamentos, o Poupatempo adotou um atendente virtual, o Poupinha, criado por uma startup selecionada em concurso público do governo de São Paulo para atrair novas tecnologias destinadas a melhorar os serviços públicos.
Um levantamento feito pelo Instituto de Identificação da Polícia Civil de São Paulo, a pedido do Poupatempo, mostra que 504 idosos com mais de 100 anos renovaram o RG nos últimos dois anos nos postos Poupatempo. Em 2016 foram 237, e três deles nasceram em 1904 e completam 114 anos em 2018. Em 2017 foram 267 centenários. O mais velho deles completou 111 em junho deste ano. Em 2015, uma cidadã de 115 anos esteve no Poupatempo Pindamonhangaba para renovar o RG. Maria Benedita Pereira da Silva, conhecida em Aparecida como dona Dita, nasceu no dia 9 de agosto de 1900 e acompanhou ao longo da vida uma virada de milênio, duas guerras mundiais e oito trocas de moedas brasileiras.
O maior desafio do Poupatempo hoje não é atender os mais velhos, mas o público jovem, que não sabe como era difícil tirar ou renovar documentos antes da criação do Poupatempo, 20 anos atrás. Esses jovens querem tudo “para ontem”, são mais exigentes. Por isso o programa está buscando novas tecnologias, para continuar fazendo a diferença.
É isso, amigo leitor. O Brasil do corporativismo, da impunidade do dinheiro e da força do sobrenome vai, aos poucos, abrindo espaço para a cultura do trabalho, da competência e do talento.
Neste Brasil sacudido por uma tremenda crise ética, alimentada pelo cinismo e pela mentira dos que deveriam dar exemplo de integridade, há, felizmente, uma ampla classe média sintonizada com valores e princípios que podem fazer a diferença. E nós, jornalistas, devemos escrever para a classe média. Nela reside o alicerce da estabilidade democrática. O que segura o Brasil é o cidadão comum. É o trabalho honrado e competente. É o empreendedorismo que consegue superar o terreno minado pela incompetência. É o empresário que toca o negócio e não dá propina. Sou otimista. Apesar de tudo.
A violência, a corrupção e a incompetência estão aí. E devem ser denunciadas. Não se trata, por óbvio, de esconder a realidade. Mas também é preciso dar o outro lado: o lado do bem. Não devemos ocultar as trevas. Mas temos o dever de mostrar as luzes que brilham no fim do túnel. A boa notícia também é informação. E, além disso, é uma resposta ética e editorial aos que pretendem fazer o jornalismo um refém da fácil cultura do negativismo.
CARLOS ALBERTO DI FRANCO É JORNALISTA
O Estado de São Paulo
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