editorial de O Globo
Não se pode reclamar de o PT ser incoerente quando está em questão
qualquer regime autoritário de origem na esquerda. Com Lula e Dilma no
Planalto, apesar dos presos políticos, de denúncias de torturas e mortes
nas ruas, a Venezuela de Chávez e Maduro sempre recebeu tratamento
especial do Brasil.
Cuba é um caso especial, pelo paroxismo. O então presidente Lula, em uma
de suas visitas aos irmãos Castro, enquanto oposicionistas faziam greve
de fome em cárceres do regime, chegou a compará-los a presos comuns no
Brasil, condenados por uma Justiça de fato independente. Muito diferente
de Cuba.
Mesmo a agenda diplomática do presidente privilegiava ditadores mundo
afora, em especial na África, onde há grande quantidade deles, que
interessavam comercialmente a empreiteiras brasileiras próximas ao PT.
Reconheça-se, portanto, que é uma demonstração de coerência o partido
apoiar o governo de força da Nicarágua, também responsável por mortes,
do ex-guerrilheiro sandinista Daniel Ortega, símbolo da esquerda
latino-americana por ter derrubado o ditador Anastasio Somoza, na década
de 70. Ortega repetiria, como se confirma agora, os passos de Fidel:
assumiu louvando a democracia, tornou-se seu algoz.
Na semana passada, o Foro de São Paulo, que congrega a esquerda
continental, reuniu-se em Havana, com a presença de Dilma Rousseff, do
boliviano Evo Morales e do venezuelano Maduro, para defender Ortega. No
evento, a secretária de Relações Internacionais do PT, Mônica Valente,
declarou ser a Nicarágua vítima de uma “contraofensiva neoliberal”.
Mas há divergências na América Latina. No Uruguai, o simbólico José
Mujica, ex-presidente, expressou sua decepção com Ortega, de quem pediu a
renúncia. A Frente Ampla, de que “Pepe” Mujica é líder, aprovou no
Senado uruguaio moção para exigir o fim da violência patrocinada por
Ortega.
O Partido Socialista chileno, de Michelle Bachelet, ex-presidente,
assumiu a mesma posição. E, no Brasil, o PSOL comparou Ortega ao
sanguinário sírio Bashar al-Assad.
Mas o PT, pelo menos até ontem, se mantinha inamovível. Mesmo com a
notícia do assassinato, em Manágua, da universitária brasileira Raynéia
Gabrielle Lima, que levou o governo brasileiro a reagir à altura.
Mas recuar no desvario — recomendável para a história do partido — não
livra o PT de ser criticado na campanha, por expor seus pendores
autoritários. Quando era poder, o partido tinha este comportamento, mas
era contido pelo Congresso.
Talvez o PT queira disputar com o candidato Ciro Gomes, do PDT, quem
radicaliza mais, para atrair eleitores à esquerda. Mau negócio, até pela
quantidade de votos deste grupo.
extraídaderota2014blogspot
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