por Ascânio Seleme
O mercado está inquieto. Assustado. Com enorme dificuldade de fazer previsões, as empresas gestoras de investimentos privados recomendam aos seus clientes cautela, paciência e atenção, muita atenção. A incerteza com o cenário eleitoral extrapola a questão política e estabelece marcos na economia. Se muitos partidos não sabem ainda como ou com quem irão na eleição presidencial, sabem menos ainda as empresas cuja tarefa é fazer projeções que ultrapassem o calendário eleitoral.
São muitas as incógnitas que impedem qualquer tipo de antecipação de tendência econômica para os meses subsequentes à posse do futuro presidente. A primeira e mais visível delas é Lula. Embora ele esteja legalmente impedido de registrar candidatura e concorrer a qualquer cargo eletivo, em razão da Lei da Ficha Limpa, neste país nunca se sabe o que pode ocorrer. Sobretudo porque quem dará a última palavra é a Justiça. No Judiciário brasileiro, parece que nunca há uma última palavra.
Pois se Lula for candidato, e se for eleito, que governo fará? Se depender das palavras do próprio, o pau vai comer. Além dos ataques seguidos à imprensa e suas promessas de criar um mecanismo de controle externo (leia-se censura) da mídia, ele já disse que voltará desencarnado do Lulinha Paz e Amor e com um programa ao avesso da famosa Carta aos Brasileiros com que se elegeu em 2002. Com o PT, embora o presidente do partido diga outra coisa, a economia corre seriíssimo risco de sofrer seguidas intervenções do Estado.
O que pode se esperar de Ciro presidente? Bomba! Se levarmos em conta apenas o que diz o candidato, teremos um país sob permanente tensão. Ciro já avisou que vai revogar o leilão de partilha do pré-sal e reestatizar empresas que julgar “imprescindíveis”. Também intervirá no Banco Central, pois anunciou que a taxa de juros praticada no Brasil impede o seu crescimento. Vai aumentar os impostos de lucros e dividendos e criar um teto para o pagamento das dívidas da União. Ciro também atacou a reforma da Previdência e prometeu rever a trabalhista. Na terça disse que vai vetar o acordo Embraer/Boeing. Um deus nos acuda.
Bolsonaro, que operaria uma catástrofe nas questões sociais e de comportamento, tampouco seria grandes coisas nos demais setores. Ele já disse que é contra a reforma da Previdência e avisou que prefere acordos bilaterais a acertos múltiplos, como o Mercosul.
Disse que vai colocar um general no Ministério da Educação para dar às escolas do país o perfil dos colégios militares. Apesar disso, agrada ao mercado ao prometer manter o tripé macroeconômico com taxas de câmbio flutuantes e metas fiscais e de inflação. Mas Bolsonaro tem um grave problema de credibilidade.
Marina defende rever algumas privatizações dos governos Temer e Dilma, mas de um modo geral sua plataforma para a economia agrada ao mercado. Suas vulnerabilidades, do ponto de vista do capital e de quem protege o capital alheio, são os prováveis entraves que uma política ambiental poderia impor aos negócios e a sua aparente falta de vontade para tomar decisões duras. Geraldo Alckmin é o mais querido no ambiente empresarial, mas até agora não deu sinais de que vai muito longe.
O fato é que, num cenário confuso e incerto, o melhor é não fazer apostas de longo prazo.
Os analistas acreditam que, qualquer que seja o resultado em outubro, a inflação vai ter crescimento acelerado em 2019. Ninguém espera hiperinflação, mas todos projetam aumento para lá da meta já para este ano. Por isso, investimento com renda pré-fixada é fria, avisam os corretores. A ideia é evitar que o cliente faça uma aplicação a um valor imaginado para a inflação, e ela venha maior e o dinheiro aplicado acabe menor ao final do período.
“Em síntese, uma situação doméstica de inflação em elevação, desemprego alto, crescimento baixo, crise fiscal e eleição incerta, aliada a uma conjuntura externa adversa aos países emergentes, nos dá a convicção de que estamos diante de um cenário extremamente desafiador para o Brasil. A cautela e a prudência, como em 1989, serão imperativas”, diz um grande consultor de investimentos em carta distribuída entre seus clientes.
O gestor cita o ano de 1989 em razão da primeira eleição presidencial direta depois do fim da ditadura, e que lembra a de hoje pela multiplicidade de candidatos e de ideias. Naquele ano, ganhou Collor, que confiscou a poupança e outros investimentos e congelou contas bancárias. O paper foi batizado “Os fantasmas do passado voltam a assombrar”. Ninguém, em sã consciência, pode imaginar que um novo presidente seja louco e corajoso o suficiente para confiscar outra vez a poupança. Mas, quem tem passado, tem medo.
Ascânio Seleme é jornalista
O Globo
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