JOEL PINHEIRO DA FONSECA FOLHA DE SP
Que ele se encontra, no mínimo, um grau acima do nível meramente humano é impossível de negar. Lembremos de sua declaração em 2016 de que "não tem uma viva alma mais honesta do que eu." Mas será que a figura humana não esconde algo muito mais sublime?
O efeito que ele produz nos militantes nos leva a crer que sim. A professora Elika Takimoto descreveu o impacto de uma ligação telefônica com o ex-presidente: "Daí, meu povo, eu saí de mim. Meu coração acelerou. (...) Chorei como um bezerro (...) Felicidade é pouco. O que sinto não tem nome". Se um simples telefonema faz isso, imagine o contato em carne e osso.
Exegetas bíblicos analisaram com cuidado as palavras de Jesus para concluir que ele era, de fato, Deus. Muito menos esforço é necessário para concluir o mesmo de Lula. "De vez em quando, eu fico pensando que as pessoas tinham de ler mais a Bíblia para não usar tanto meu nome em vão", disse em depoimento à Justiça em 2017, casualmente revelando sua real natureza.
No mesmo ano, no Rio, bradou às massas: "O Lula não é o Lula. O Lula é uma ideia. O Lula é uma ideia assumida por milhões de pessoas. E eles não sabem que o Lula já renasceu em milhões de mulheres e homens". Mas sua divindade só resplandeceu mesmo no antológico discurso em Belo Horizonte já em 2018. "O problema não é o Lula, são os milhões de Lulas." E, por fim, a revelação plena: "Eles estão lidando com um ser humano diferente. Porque eu não sou eu, eu sou a encarnação de um pedacinho de célula de cada um de vocês". Na democracia, Deus é o povo. Lula é Deus. Logo...
Em entrevista a jornalistas em janeiro, declarou: "Eu quero que um dia eles peçam desculpas para mim. Ou peçam desculpas para o povo brasileiro". E lá existe diferença?
A filósofa Márcia Tiburi, que é também teóloga do lulismo, concorda: "Lula continua em seu papel como representante do povo idêntico ao povo", escreveu em artigo na revista Cult. Assim, prendê-lo é inócuo. "A estrela de Lula é maior. Não se apagará de modo algum da história do Brasil, nem do coração das classes humilhadas."
A fé acredita, mas a carne é fraca. Hoje a comunidade fiel teme a prisão do mestre, que segue os passos de Jesus, concorrente que ele inclusive superou, conforme revelou em 2010. "Se eu pudesse dar uma imagem das punhaladas que levei e pudesse tirar a camisa, meu corpo apareceria mais destroçado do que o de Jesus Cristo."
O mundo celebrou neste domingo (1º) a Páscoa, dia que comemora a libertação do povo judeu e, para os cristãos, a ressurreição de Cristo. Os seguidores de Lula enxergam o paralelo. "Hoje é dia de lembrar do barbudo que caiu na delação premiada de Judas e foi condenado sem provas pelos cidadãos de bem", diz o post do Levante Popular da Juventude.
Todos aguardam apreensivos. Preparam romarias. Caso o pior aconteça e a lei dos homens prevaleça, será que o messias também retornará no terceiro dia? Ou será que ele é só um homem comum que foi condenado por crimes e que deve ser punido como qualquer cidadão? Não! Afaste essa blasfêmia de sua mente.
Joel Pinheiro da Fonseca
É economista pelo Insper, mestre em filosofia pela USP e palestrante do movimento liberal brasileiro.
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