Jornalista Andrade Junior

segunda-feira, 30 de abril de 2018

A pobreza do debate -

WILLIAM WAACK ESTADÃO

Assim como a prisão do ex-presidente Lula, Aécio Neves agora réu no Supremo Tribunal Federal é um acontecimento político de importância muito maior do que o destino reservado ao agente político, ao indivíduo. O episódio do senador tucano que passou de quase presidente para candidato a presidiário oferece uma boa leitura do momento político brasileiro.

Não estou falando aqui de quem está dentro da Lava Jato nem das consequências para as diversas agremiações políticas e como se movimentam visando às próximas eleições. O caso Aécio virou uma bem acabada expressão do que é a falência política brasileira.

Pois quatro dos cinco ministros que aceitaram a denúncia apresentada pela Procuradoria-Geral da República (PGR) tornaram o senador réu por obstrução da Justiça (além de corrupção passiva), isto é, por tentar atrapalhar a Operação Lava Jato. Aécio teria praticado esse crime, segundo a acusação, utilizando-se da sua atividade como parlamentar para discutir, entre outras coisas, projetos de lei como o que previa punição a agentes públicos por abuso de autoridade.

Não vou entrar no mérito da acusação nem nas alegações da defesa do senador. O que me interessa aqui é registrar um fato que me parece de vital importância para a política brasileira. Onde está a linha que divide a atividade do parlamentar (que inclui, claro, discutir projetos como abuso de autoridade) e a pura e simples bandidagem? Mais ainda: quem traça essa linha e decide se uma articulação política no parlamento passou a ser uma articulação para proteger políticos do alcance da Justiça?

No atual momento político brasileiro, não importa se a gente gosta ou não do que está acontecendo, as respostas a essas duas perguntas são evidentes. Procuradores, delegados, juízes e, agora, também ministros do Supremo leram História (ou saíram atrás de quem leu o que aconteceu na Itália) e estão convencidos de que políticos, deixados entregues a si próprios, vão se articular para defender apenas seus próprios interesses, sobretudo os interesses espúrios. E decidiram eles mesmos, os integrantes da Lava Jato, traçar a linha entre o que é política e o que é bandidagem. Traçado que interpretam como julgam necessário.

Reitero aqui a inutilidade, neste momento, de se estabelecer quem domina a objetividade dos fatos, se é a acusação que está com a “verdade” ou se é a defesa no caso do senador. Fato, em política, costuma em geral ser a percepção que se faz de um “fato”, e a percepção que tomou conta do momento brasileiro, e desfruta de extraordinária popularidade, é a que está contida na denúncia da Procuradoria-Geral da República: políticos não prestam, política é coisa suja e, mesmo quando parlamentares parecem estar discutindo projetos “sérios” (como o do abuso de autoridade), estão, no fundo, apenas se protegendo.

O fato dessa narrativa acima ter se tornado tão abrangente (talvez Gramsci a tratasse como “bloco histórico”) explica em parte a pobreza do atual debate político no Brasil, subordinado ao tema do combate à corrupção. Claro que combater a corrupção é essencial em qualquer parte e a qualquer momento. A falência da política brasileira está em não ter sido capaz, também por falta de lideranças, de desenvolver qualquer outro eixo relevante de debate.

Vamos aplaudir a prisão de Lula e outros, eventualmente de Aécio e outros, o que nos orgulha e enche de esperanças. E vamos continuar nos perguntando por que as coisas mudam tão pouco.





























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