Jornalista Andrade Junior

sábado, 21 de abril de 2018

"A democracia corrompida",

 por Carlos Fernando dos Santos Lima O Globo

A corrupção degenerou a democracia brasileira. Vivemos hoje um ambiente polarizado, muito por conta da degradação de nossa classe política, incapaz de liderar pelo exemplo moral, incapaz de se legitimar perante a população por meio do sistema democrático.

Lembro ainda quando, adolescente, compareci ao Comício das Diretas. Mal se ouvia a respiração da multidão quando líderes como Ulysses Guimarães, Teotônio Vilela, Leonel Brizola e Tancredo Neves discursavam, tal era a atenção dos presentes. Acreditávamos no que eles falavam, acreditávamos no que representavam, mesmo que, talvez, eles não fossem tudo o que pensávamos, mas naquele momento representavam verdadeiramente o desejo do povo pela volta da democracia.

Entretanto, esses líderes permitiram que uma geração de burocratas partidários, mais interessados no poder em si e não em servir ao país, crescesse como erva daninha dentro dos partidos. Cuidavam esses escalões inferiores das finanças partidárias, coisas por assim dizer indignas das grandes lideranças. Mas dinheiro significa poder. Depois que partiram as grandes lideranças, segundo e terceiro escalão assumiram o comando, impondo o poder do dinheiro dentro das estruturas partidárias. Isso contaminou nossa democracia e a degenerou em demagogia movida pelo poder econômico. Por isso, o deserto de verdadeiras lideranças políticas em nosso país atualmente.

Infelizmente, muitos, da classe política e da população, igualmente pensam a democracia de modo autoritário, como se ela fosse simplesmente a vontade da maioria, como se esta pudesse impor sua vontade às minorias. Isso é absolutamente incorreto. Os requisitos para uma verdadeira democracia passam pelo respeito às minorias e pela possibilidade desta em se transformar em maioria através de eleições periódicas, livres, com ampla liberdade de expressão de todos os cidadãos e paridade de oportunidades entre todos os candidatos, partidos e correntes de pensamento.

Aí é que mora o problema. Como dissemos, nossa democracia foi contaminada pelo poder econômico. Não como na democracia americana, onde o dinheiro das grandes corporações influencia o resultado, mas dentro de um sistema de doações legais. Aqui o poder econômico se oculta na ilegalidade, para não dizer no crime propriamente dito. A corrupção se transformou em uma forma de arrecadação para os detentores do poder continuarem no poder.

Assim, o que temos é a corrida de todos (exceções no Brasil são insignificantes) pelo dinheiro ilícito. Se um partido chega ao poder federal, estadual ou municipal, ele precisará cooptar outros partidos — muitos dos quais somente existem para essa finalidade — pela distribuição de cargos e, ao menos, uma cegueira intencional para o que será feito nesse pequeno feudo pelo seu “dono”.

E se um partido chega ao poder federal, outros, na oposição, por receio do poder econômico ilícito que será arrecadado por aquele, fazem o mesmo em governos estaduais ou municipais por todo o país. Instaura-se aí a corrida pela corrupção em todos os níveis, que é o fenômeno desvelado pela operação Lava-Jato.

Isso não é política, mas crime. Não é a criminalização da política, mas revelar que o crime há muito tempo contaminou o sistema político-partidário. Campanhas caras, manutenção do controle partidário e a própria ganância por poder e dinheiro são o que movem o sistema político. Isto precisa mudar. Precisamos voltar a acreditar que o poder é do povo, e este poder gera a responsabilidade de cada cidadão em se envolver nos negócios públicos. Não precisamos de heróis nem de salvadores da pátria. Precisamos de cidadania. E precisamos voltar a ter pessoas de bem na política.

Carlos Fernando dos Santos Lima é procurador Regional da República e membro da força-tarefa da Lava-Jato do Ministério Público Federal no Paraná












































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