O
Estado de São Paulo – 21/11/2012
O absoluto
desrespeito institucional que significa classificar a Suprema Corte do País
como tribunal de exceção por causa do julgamento do mensalão é despropósito que
beira o golpismo. Mais absurdo ainda é verificar que essa tentativa de golpear
uma das instituições fundamentais do sistema democrático é explicitamente
estimulada pelo partido que há mais de uma década exerce - inclusive pelos
meios ora judicialmente condenados - a hegemonia política no plano federal: o
PT.
Na véspera da
comemoração do Dia da República, o diretório nacional do PT divulgou nota
oficial em que define sua posição a respeito do julgamento pelo STF, ainda em
andamento, da Ação Penal 470, no qual já foram condenados por crimes de
corrupção ativa e formação de quadrilha os então dirigentes do partido, de
direito e de fato, que urdiram e executaram a trama criminosa da compra de
apoio parlamentar dos principais líderes dos "300 picaretas" que
dominam o Congresso Nacional, segundo memorável julgamento feito por Luiz
Inácio Lula da Silva em 1993 - quando ainda estava muito longe do Palácio do
Planalto.
O argumento central
da nota oficial petista é de que o STF fez um "julgamento político"
com a intenção deliberada de "criminalizar o PT": "Trata-se de
uma interpretação da lei moldada unicamente para atender à conveniência de
condenar pessoas específicas e, indiretamente, atingir o partido a que estão
vinculadas". Ou seja, os ministros do Supremo, que, em ampla maioria foram
nomeados pelos governos do PT, estariam conspirando para acabar com o partido a
quem devem as togas que envergam. Para tanto, não se constrangem, segundo a
nota, em desrespeitar "garantias constitucionais" e instalar "um
clima de insegurança jurídica"; de lançar mão de "uma teoria nascida
na Alemanha nazista" (a teoria do domínio do fato); de adotar a
"noção de presunção de culpa em vez de inocência".
Além disso, alegam os
petistas, os ministros "confirmaram condenações anunciadas, anteciparam
votos à imprensa, pronunciaram-se fora dos autos e, por fim, imiscuíram-se em
áreas reservadas ao Legislativo e ao Executivo, ferindo assim a independência
entre os poderes". Em outras palavras: os ministros do STF estão tendo um
comportamento condenável.
Ao divulgar a nota à
imprensa, o iracundo presidente do PT, Rui Falcão, reforçou todos os argumentos
contidos no documento, mas, pressionado a opinar se não há nada de positivo que
se possa extrair do julgamento do mensalão, meteu os pés pelas mãos e
contradiz-se ao apelar para o mantra petista segundo o qual este é hoje um país
em tudo muito melhor do que antes: "As instituições estão funcionando
legalmente". Não há registro de que algum impertinente tenha perguntado:
"Inclusive o STF?".
Para todos os
efeitos, a liderança petista dá a entender que a nota de 14 de novembro encerra
o assunto. É indisfarçável a intenção de preservar o partido do prolongamento
de uma polêmica que o faz sangrar em público. Mas os termos da nota e a
intenção dissimulada dos dirigentes petistas - além dos apelos dos próprios
condenados - estimulam as alas radicais do partido e das organizações sociais
que o apoiam a atuar com a "mão do gato", mobilizando-se em
"defesa do PT".
Exemplo claro é a
atitude do esquerdista radical Markus Sokol, integrante do diretório nacional
do PT, para quem existe "insatisfação na base do partido" e por isso
se impõe a realização de atos públicos para "manifestar repúdio" ao
julgamento do STF. E afirma, escancarando intenções golpistas: "Para além
do apenamento, há uma agressão ao PT. Se ficar sem resposta, outras
organizações que incomodam a elite dominante não poderão se sentir
garantidas".
Por
sua vez, a "Consulta Popular", organização que alega reunir representantes
de 17 Estados, ao final de uma reunião plenária de três dias conclamou à luta
"pela revogação das condenações e das penas ilegalmente impostas".
Não fica claro no documento, diante do princípio da independência e autonomia
dos poderes, a quem caberá a responsabilidade de "revogar" as
condenações e as penas. Talvez um Ato Institucional?
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