Merval
Pereira, O Globo
A nota
oficial da Executiva Nacional do Partido dos Trabalhadores revela a face autoritária
desse partido, nascido sob o lema de ser o paradigma de uma nova maneira de
fazer política limpa e comprometida com o bem comum, lema que nunca deixou de
ser o que sempre foi: apenas um instrumento de marketing político para a tomada
do poder.
Desde
os primeiros comandos municipais que alcançou, com a aura de estar levando os
trabalhadores ao poder, o PT passou a atuar nos bastidores da baixa política,
no submundo das licitações fraudulentas, conseguindo enganar muitos durante
muito tempo, até que o escândalo do mensalão estourou em 2005, quando o partido
já ocupava o poder central.
A
direção nacional do PT ainda é dominada pelo grupo político liderado pelo réu
condenado José Dirceu, e por essa razão ele é o único petista citado
expressamente.
A verdadeira
face revelada pela nota oficial é mascarada pela defesa da democracia, mas na
verdade o PT tenta desmoralizar as instituições que não conseguiu ainda
aparelhar.
Sob um
verniz de defesa da liberdade de expressão, a nota não passa de mero pretexto
para mais uma vez tentar desqualificar o Supremo Tribunal Federal e a liberdade
de imprensa, dois dos principais obstáculos à dominação total dos mecanismos
democráticos do Estado pretendida pelo PT, na busca de uma democracia apenas
formal, como as dos vizinhos “bolivarianos” aos quais o PT dedica seus melhores
apoios.
Ao
insistirem na lenda urbana de que Dirceu foi condenado sem provas pelo uso
indevido da teoria do domínio funcional do fato, os petistas que dominam a
Executiva querem criar uma fantasia e iludir a sociedade, que acompanhou o
julgamento por mais de três meses pela televisão e está cansada de saber que
existem “provas torrenciais” contra o ex-ministro todo-poderoso.
O
próprio Claus Roxin, jurista alemão teórico da tese do domínio do fato, explicou
que faz parte da tradição do direito anglo-saxão a ideia de que, em certas
circunstâncias, o réu não “tinha como não saber” o que acontecia à sua volta,
embora ele não concorde com a tese.
O
comentário do presidente do Supremo, Ayres Britto, citado na nota como exemplo
da condenação sem provas de Dirceu, é apenas mais um elemento de convicção
utilizado para a condenação, e foi trazido ao julgamento pelo ministro Luiz
Fux.
Às duas
teorias somaram-se as inúmeras provas testemunhais e indiciárias para permitir
uma ampla maioria a respeito da culpabilidade do “chefe da quadrilha”. Afinal,
um resultado de 8 a 2 só pode ser entendido como uma condenação peremptória.
Quando
fala em “fim do garantismo”, o PT sugere que muitos dos juízes tidos como votos
a favor dos réus mudaram as posições tradicionais para condená-los, mas o que
realmente aconteceu é que as provas eram tantas e tão explícitas que ministros
“garantistas” como Celso de Mello, Marco Aurélio Mello e Gilmar Mendes não
tiveram dúvidas em condená-los.
Eles
não mudaram posições, só não havia direitos a serem garantidos, mas crimes a
serem punidos.
Quando
a nota diz que “pairam dúvidas se o novo paradigma se repetirá em outros
julgamentos, ou, ainda, se os juízes de primeira instância e os tribunais seguirão
a mesma trilha da Suprema Corte”, fica-se sem saber se petistas torcem para que
não se repita, já que o considera ilegítimo, ou se exigem a postura em outros
julgamentos, mesmo considerando a incoerência implícita nessa reivindicação.
A
reafirmação de que “o STF fez um julgamento político, sob intensa pressão da
mídia conservadora”, reincide no ridículo, já que o colegiado foi nomeado em
sua maioria — 8 dos 11 ministros no início do julgamento, e agora 6 dos 9 — por
governos petistas.
A nota
reafirma “sua convicção de que não houve compra de votos no Congresso Nacional,
nem tampouco o pagamento de mesada a parlamentares. Reafirmamos, também, que
não houve, da parte de petistas denunciados, utilização de recursos públicos,
nem apropriação privada e pessoal”.
Diante
das provas dos crimes cometidos, que o PT tenta transformar em “erros e
ilegalidades” motivados pela legislação eleitoral, nem mesmo o ministro Dias
Toffoli, o mais ligado ao PT, teve ânimo para tal defesa. Ele retirou do
esquema o caráter político, mas disse que os crimes foram cometidos “por
motivos pecuniários”.
Para tentar livrá-los da cadeia, Toffoli transformou-os em reles
ladrões dos cofres públicos, sem dar-lhes o direito de dizer que fizeram o que
fizeram “pela causa”
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