por Dora Kramer Veja
VAMOS, venhamos, convenhamos e sejamos francos: até dois meses atrás
ninguém estava especialmente preocupado com o tema da execução de penas
após julgamentos em segunda instância. Daí que o atual sentido de
urgência em relação ao assunto só pode ter a ver com a confirmação da
condenação do ex-presidente Luiz Inácio da Silva no TRF4 e, por isso, se
configura claro casuísmo.
A questão, examinada por três vezes pelo Supremo Tribunal Federal e
decidida por maioria do plenário há pouco mais de um ano, estava
razoavelmente pacificada. Afora advogados de defesa, não havia no país
quem estivesse especialmente sensibilizado com a situação dos vários
réus obrigados ao imediato cumprimento da pena assim que tiveram as
respectivas sentenças corroboradas por decisões colegiadas.
Ao contrário. Havia razoável consenso sobre o acerto da decisão que
trouxe de volta o entendimento em vigor até 2009, quando o STF permitia
essas prisões, e reformado em 2016 depois de um período em que as
prisões só poderiam ocorrer após o esgotamento de todos os recursos
possíveis, o que na prática significava impunidade quase eterna para
quem dispusesse de bons e bem remunerados defensores.
Mas avançamos. Os escândalos patrocinados pelo PT estabeleceram uma nova
realidade, na qual as decisões judiciais levaram em conta o exame
rigoroso dos fatos, deixando de lado o excesso de formalismo que criou
uma casta de inimputáveis.
Com o caso do mensalão, isso mudou. Desde o posicionamento dos juízes no
recebimento da denúncia até o julgamento final, com a condenação de
gente que se acreditava acima da lei. A tal “rotina de desfaçatez”
denunciada pelo ministro Marco Aurélio Mello em discurso de posse na
presidência do Tribunal Superior Eleitoral, em 2006, fora rompida. Para
sempre.
O Supremo foi acusado de atuar como tribunal de exceção. O relator da
ação e depois presidente da Corte, Joaquim Barbosa, comparado ao
inquisidor Torquemada. Toda sorte de injúrias foi dirigida ao STF, sem
que nenhuma delas tivesse sustentação legal. Prevaleceram as evidências
dos crimes, numa óptica que anos depois viria a também prevalecer na
investigação dos atos corruptos cometidos na Petrobras.
Não por acaso, hoje a ministra Cármen Lúcia, presidente do tribunal, é
alvo de acusações. Dizem que ela estaria incorrendo em casuísmo ao
resistir a levar ao exame da Corte o tema da prisão de condenados após
decisão em segunda instância, muito embora o casuísmo esteja claramente
exposto no oposto.
A presidente do Supremo está preservando a situação atual: a decisão em
vigor e que sustentou legalmente a prisão de vários réus com sentenças
confirmadas após recurso. Alterar a lei é possível, embora não seja
passível de aceitação o entendimento de que a mudança possa ser feita
para beneficiar ou prejudicar alguém. Seja presidente, deputado,
vereador ou carregador. Todos iguais perante a Justiça que vem se
impondo no cenário de um novo e menos injusto Brasil.
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