Carlos Alberto Sardenberg:O Globo
Quando acaba essa recessão? Essa foi a pergunta refeita depois de que
ficamos sabendo do desastre do terceiro trimestre de 2016, conforme os
números do PIB divulgados ontem pelo IBGE. Deu tudo vermelho. Todos os
itens considerados nas contas nacionais — consumo das famílias, gasto do
governo, investimentos feitos, exportações e importações — e todos os
setores — agropecuária, indústria e serviços — mostraram quedas, sob
qualquer critério de comparação. Um strike negativo.
Como os dados já conhecidos do quarto trimestre não são lá essas coisas,
analistas de fora do governo começaram ontem mesmo a rever seus
cenários para 2017. Todo mundo acha que 2017 será melhor que 2016, o que
não é grande coisa já que neste ano a economia deve amargar uma queda
de mais de 3%.
Mas todos, pelo menos por enquanto, acham que o país sai do vermelho em
2017, encerrando a mais longa e mais profunda recessão de nossa
história. Logo, será um ano melhor.
Teremos um ano melhor, mas quanto? Pelo que pude checar ontem, as novas
projeções para o PIB variam de 1,3% a zero, que estão chamando de
estabilidade.
De onde viria essa recuperação? Aqui há bastante acordo: o Banco Central
continuará derrubando os juros, com a queda da inflação; o ajuste das
contas públicas deve avançar; a agropecuária vai ajudar; as exportações
idem; e os investimentos só podem subir com a recuperação da Petrobras e
do setor de óleo e gás, mais o processo de privatização/concessão de
infraestrutura.
Tudo isso é plausível e tem amplo consenso. O que vai fazer a diferença
está na intensidade, na coerência e na persistência da política
econômica. Considerem as privatizações e concessões de aeroportos,
portos, rodovias e ferrovias, e mais as novas licitações de poços de
petróleo. De fato, trata-se de poderosa atração de investimentos.
Não é fácil fazer, entretanto. Os leilões são complexos, precisam
estipular regras confiáveis para os investidores e para o setor público,
de modo, por exemplo, a evitar cartéis e empresas de má qualidade.
Além disso, todo o governo precisa estar empenhado na mesma direção. A
licitação de um porto, um aeroporto, qualquer coisa grande, exige a
intervenção de vários ministérios e muito especialmente daqueles que
devem liderar o processo, o presidente e o ministro da Fazenda.
Ora, se o presidente e seus assessores mais próximos estão preocupados
com o apartamento de Geddel ou em restringir a Lava-Jato, a coisa não
anda.
Do mesmo modo, o Banco Central pretende continuar com a queda dos juros,
mas em qual intensidade? Para acelerar, além da queda da inflação,
precisa ter uma razoável expectativa de que a política econômica em
sentido amplo, do ajuste de contas às grandes concessões, será
efetivamente aplicada. Será?
É como se tivéssemos dois governos. Um na economia, outro na política,
este último envolvido com a Lava-Jato e suas repercussões. Enquanto
tiver ministros e líderes parlamentares mais preocupados em salvar a
própria pele — ou o próprio apartamento — a expectativa em relação à
condução da economia fica prejudicada.
O pessoal se pergunta: onde está o presidente Temer? No domingo passado,
ele reuniu os presidentes da Câmara e do Senado para garantir que não
haveria anistia ampla ao caixa dois. Dois dias e uma madrugada depois, a
Câmara aprova um pacote anticorrupção, mas incluindo uma legislação que
ameaça o Ministério Público e o Judiciário — ali exatamente onde se dá o
efetivo combate à corrupção.
A base governista votou — o que justifica a pergunta: até onde Temer está metido nisso?
Por outro lado, o mesmo Senado de Renan vota direitinho a emenda
constitucional que impede o aumento da despesa pública — peça essencial
da recuperação econômica.
Como se dizia, o Brasil não é para amadores. E tem mais um ponto: a
situação econômica piorou tanto, ficou ruim para tanta gente, que as
políticas de ajuste se tornaram uma necessidade. Mesmo quem não gosta de
segurar a despesa pública — e tem muitos no governo que não gostam — já
percebeu que a alternativa é ajuste por bem ou ajuste por mal, como
ocorre em alguns estados.
O quadro não é simples, mas — quer saber? — era pior quando Itamar,
outro vice do PMDB, assumiu depois do impeachment de Collor. E deu no
Plano Real, que encerrou 20 anos de superinflação e desajuste fiscal.
Milagres acontecem.
extraídaderota2014blogspot
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