Editorial O Estado de S.Paulo
Numa iniciativa que surpreendeu a comunidade acadêmica, o Conselho de
Reitores das Universidades Estaduais Paulistas (Cruesp) decidiu não reajustar
os salários dos professores e servidores em 2014. Esta será a primeira vez, nos
últimos dez anos, que o funcionalismo da Universidade de São Paulo (USP), da
Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) e da Universidade Estadual Paulista
(Unesp) ficará sem a correção da inflação.
A medida é drástica e foi a única saída encontrada pelas três
instituições para contornar a crise financeira que estão enfrentando, por terem
comprometido quase todas as suas receitas com a folha de pagamento. A situação
mais grave é a da USP. Ela gasta 105,14% de seu orçamento com salários - e essa
despesa pode crescer ainda mais por causa da progressão de carreira dos
servidores técnico-administrativos e dos professores. Isso a obrigou a consumir
R$ 250 milhões de suas reservas financeiras só nos três primeiros meses do ano.
Desde 2012, a USP já gastou R$ 1,3 bilhão dessas reservas - o equivalente a 40%
do total. Na Unicamp e na Unesp, a folha de pagamento consome 96,52% e 94,47%
de seus orçamentos, respectivamente.
Há três semanas, o reitor da USP, Marco Antonio Zago, já havia
comunicado à comunidade acadêmica que, por falta de recursos, fora obrigado a
suspender as contratações de novos professores, a adiar a construção de novas
obras e a estudar a redução da frota e dos contratos de terceirização dos
serviços de segurança, limpeza e manutenção predial.
As unidades da maior universidade brasileira estão economizando até
papel. Viagens para seminários nacionais e internacionais foram canceladas. O
financiamento de linhas de pesquisa está sendo revisto. Somente os restaurantes
universitários, os serviços de utilidade pública e a política de apoio
estudantil não foram cortados. Com essas medidas, a USP quer reduzir em 30% as
despesas de 2014 com custeio e investimento. A Unicamp e a Unesp também
adotaram medidas semelhantes, porém menos drásticas do que a USP, para conter a
crise financeira. A receita básica da USP, da Unicamp e da Unesp equivale a
9,75% do ICMS. Seus dirigentes alegam que a receita desse tributo tem sido
afetada pelo baixo crescimento da economia, reduzindo o valor dos repasses.
A decisão do Cruesp ocorreu no momento em que as entidades de
professores e servidores das três universidades estaduais paulistas estavam
começando a se mobilizar para a campanha salarial de 2014, exigindo um reajuste
de 9,78%.
Para aumentar as verbas orçamentárias das três instituições, as
entidades de professores exigem que o porcentual da receita do Estado destinado
às universidades seja aplicado não apenas sobre o ICMS, mas sobre as demais
receitas do governo paulista - inclusive as transferências federais, a dívida
ativa e o que é arrecadado pelos programas de combate à sonegação. Já os
sindicatos de servidores querem que as três universidades paulistas
simplesmente utilizem o que resta de suas reservas estratégicas para financiar
o reajuste dos salários. No caso da USP, as entidades de docentes e servidores
também pedem a realização de uma auditoria sobre a gestão do ex-reitor João
Grandino Rodas, a quem acusam de ter promovido gastos perdulários e financiado
medidas de discutível utilidade, como a abertura de escritórios no exterior.
O problema das universidades estaduais paulistas, contudo, não é apenas
financeiro. Cresceram de forma desordenada e enfrentam gargalos burocráticos e
dificuldades para redistribuir funcionários entre as unidades. Sob a
justificativa de desenvolver atividades de extensão, lançaram os mais variados
programas sociais, perdendo o foco acadêmico. E, embora ofereçam centenas de
cursos, muitos têm currículos defasados e estão desconectados com a realidade
do trabalho. Reformar estruturas administrativas arcaicas, redefinir
prioridades acadêmicas e buscar novas fontes de financiamento, inclusive
discutindo com rigor a adoção do ensino pago - esses são os grandes desafios
que a USP, a Unicamp e a Unesp têm de enfrentar.
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