ALBERTO DINES
O Brasil ofereceu na última terça-feira, em São Paulo, importante contribuição para o descrédito do sindicalismo como instrumento de defesa dos direitos dos trabalhadores, quando uma facção da agremiação que reúne motoristas e cobradores de ônibus urbanos, numa operação de guerrilha, organizou uma greve-surpresa, trancou o trânsito na hora do rush e durante os dois dias seguintes estabeleceu o caos na maior metrópole do país.
A operação comprometeu seriamente a imagem de um sindicato (cujo histórico não é dos mais decentes) e que, na véspera, fechara um acordo com o patronato. Afetou drasticamente a vida de um milhão de trabalhadores de outros sindicatos impedidos de cumprir suas obrigações e prejudicou a sociedade ao descumprir a lei que determina que nas paralisações no serviço público seja garantido um funcionamento mínimo à população.
Mais grave: confirmou as suspeitas de infiltração da grande delinquência nas manifestações promovidas pelos movimentos sociais. Os agitadores retiraram as chaves dos ônibus nas garagens impedindo sua utilização, abandonaram alguns com pneus furados em importantes cruzamentos no perímetro central e depredaram mais de cem coletivos.
As autoridades atônitas denunciam a sabotagem, mas na véspera de um evento mundial com as dimensões da Copa do Mundo acautelam-se e procuram evitar um aumento das tensões com a entrada em cena das grandes centrais ávidas para incrementar a sua influência política. As polícias, por sua vez, mantêm a tática de minimizar a infiltração das facções criminosas imaginando com esse faz de conta que pode ocultar da população o poder crescente do crime organizado na vida nacional.
O sindicalismo moderno tem as suas origens na Revolução Industrial no final do século 18 e suas primeiras ações dirigiram-se contra as máquinas que ofereciam aos patrões a oportunidade de diminuir postos de trabalho e impor baixa remuneração. Marx e Engels lembraram em meados do século 19 que o proletariado deveria unir-se para obter melhores condições: o inimigo não era a máquina, mas aqueles que as empregavam para fomentar a desunião.
Nos anos 20 e 30 do século passado, o fascista Benito Mussolini adotou a Carta del Lavoro que serviu de inspiração a inúmeros governos autoritários, inclusive ao Estado Novo, implantado por Getúlio Vargas em 1937. Os sindicatos mudaram meta e táticas: o objetivo passou a ser o fortalecimento do Estado e não a melhoria das condições de vida e trabalho. O sindicalismo chapa-branca estimulado por Vargas apelidado de “pelego” (a pesada manta colocada entre os arreios e a pele dos cavalos para amenizar os efeitos do trote) foi igualmente utilizado na ditadura militar para oferecer uma base de apoio popular a um governo discricionário.
Quem liquidou o peleguismo foi o líder Luiz Inácio Lula da Silva a partir das greves no ABC, São Paulo, nos fins dos anos 70 com o saneamento dos sindicatos, especialmente os de metalúrgicos, reconduzidos ao caminho original de lutar por melhores condições sociais e políticas.
Três décadas depois, é preciso que os seguidores de Lula não permitam a substituição dos pelegos por malfeitores. Há indícios de que alguns militantes estão deixando os escrúpulos de lado para obter apoios em esferas próximas ao crime organizado. A proximidade das eleições justificaria a jogada. É insanidade.
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