EDITORIAL FOLHA DE SP
Com a proximidade da Copa do Mundo, surge um grande estímulo para que diversas categorias profissionais se mobilizem em greves e manifestações. Aposta-se no óbvio interesse das autoridades em logo resolver qualquer dissenso, para que se projete imagem de normalidade durante o evento.
Nesse sentido, não espantam muito, embora sejam inquietantes, ações como a invasão de um terreno nas imediações do Itaquerão, os protestos de professores da rede paulistana de ensino ou mesmo os inaceitáveis movimentos de policiais civis e militares pelo país.
Ultrapassa-se o sentimento de espanto, contudo –para alcançar os limiares da mais aguda indignação–, diante do espetáculo de caos e arbitrariedade que um grupo de motoristas e cobradores de ônibus, descontentes com as resoluções de seu próprio sindicato, impôs aos moradores de São Paulo.
Em assembleia na segunda-feira (19), à qual compareceram 4.000 trabalhadores (cerca de 10% da categoria), decidiu-se aceitar proposta de 10% de aumento nos salários de motoristas e cobradores.
O montante supera com folga o índice de inflação dos últimos 12 meses, de 6,3%, e praticamente iguala a demanda original do sindicato, que pedia correção de 13%.
O que se segue não pode ser descrito senão como absurdo. Uma parcela de dissidentes –não se sabe ao certo com que tipo de fundamentação econômica, que grau de rivalidade interna, que gênero de inspiração política– considera insuficiente o reajuste e, como se já não lhe faltasse razão, decide agir por conta própria.
Vale dizer, impôs a lógica do bando, da horda, da quadrilha, sobre toda a população.
Passageiros foram expulsos à força dos ônibus em que estavam –em alguns casos, sob a mira de revólver, diz o secretário de Transportes do município, Jilmar Tatto. Com pneus furados e chaves confiscadas, veículos foram postados em vias de grande circulação.
O congestionamento foi recorde no ano; universidades cancelaram aulas, partições públicas suspenderam atividades; houve tumulto e pânico no Metrô –e, por ironia, alguns professores em greve faltaram a uma manifestação, dada a falta de transporte.
Não surpreende que, conforme pesquisa Datafolha, tenha despencado a simpatia pelos protestos na cidade. Em junho passado, 89% eram favoráveis a eles e só 8% se diziam contra; agora, 52% apoiam tais atos, e a rejeição é de 44%. Além disso, passou de 46% para 73% a fatia dos que veem as manifestações rendendo mais prejuízos que benefícios aos paulistanos.
Nada mais provável que a reprovação continue a crescer se, em vez de movimentos de reivindicação pacífica e de amplo escopo, o que se tem é a ação de um ajuntamento de tumultuários dispostos a infernizar o cotidiano de todos com os métodos do gangsterismo.
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