por Aloísio de Toledo Cesar
As notícias publicadas pelo Estado a
respeito do sítio em Atibaia, do qual Lula nega ser o proprietário,
chegaram à fase final e aguçam a curiosidade das pessoas sobre qual
poderá ser a sentença da juíza Gabriela Hardt, que herdou os processos
de Sergio Moro referentes à Operação Lava Jato.
É sempre arriscado tentar prever o que se passa na cabeça de um juiz,
mas, de qualquer forma, imperioso é reconhecer que há uma grande
semelhança entre os processos judiciais envolvendo o famoso apartamento
triplex no Guarujá e o sítio em Atibaia. As matérias de fato e de
direito são absolutamente as mesmas, ou seja, Lula negava que o
apartamento fosse dele e agora é capaz de jurar de pés juntos que o
sítio não lhe pertence.
Do ponto de vista estritamente jurídico, a circunstância de o sítio ser
ou não ser dele não tem tanta relevância, porque a gravidade do crime
propriamente dito não está na posse do sítio, mas na circunstância de
haver aceitado dinheiro sujo, saído da caixinha da Petrobrás com
endereço ao Partido dos Trabalhadores.
Existem depoimentos absolutamente claros de que Lula aceitou dinheiro
com essa origem para a reforma e melhorias do sítio, por solicitação sua
e da falecida esposa. Depois que assumiu a Presidência da República, o
hoje presidiário nunca mais andou com gente pobre, aqueles que o
acompanhavam desde os tempos do Sindicato dos Metalúrgicos de São
Bernardo do Campo, passando a preferir a companhia dos amigos
milionários, que ficavam cada vez mais ricos com a sua ajuda.
Pois bem, foram exatamente esses amigos ricos que inculparam o
ex-presidente, confessando judicialmente haver-lhe entregado dinheiro
sujo, vindo da caixinha da Petrobrás, para a reforma do sítio. E por
mais que se esforçassem, os advogados de Lula não conseguiram desfazer
essa realidade e se fixaram, repetidamente, na versão de que ele é um
perseguido político que foi prejudicado propositadamente pelo juiz
Sergio Moro.
Mesmo quem não é da área jurídica pode facilmente entender o crime
praticado. O Código Penal Brasileiro dispõe com toda a clareza o que vem
a ser o delito de corrupção passiva que teria sido praticado pelo
ex-presidente da República: “Artigo 317 – Solicitar ou receber, para si
ou para outrem, direta ou indiretamente, ainda que fora da função ou
antes de assumi-la, mas em razão dela, vantagem indevida, ou aceitar
promessa de vantagem. Pena: reclusão, de 2 (dois) a 12 (doze) anos, e
multa”.
Os doutrinadores ensinam que a solicitação, o recebimento ou a aceitação
de promessa pode ser para si (para o próprio agente) ou para outrem. É
imprescindível que a solicitação, o recebimento ou a promessa sejam
feitos em razão da função pública do agente, ainda que fora do cargo ou
até antes de assumi-lo.
A modalidade de receber implica um delito necessariamente bilateral,
porque demanda a presença de um corruptor (autor de corrupção ativa). No
caso, esses corruptores eram amigos íntimos de Lula e confessaram a
entrega do dinheiro, ou seja, a trama criminosa se aperfeiçoou,
obrigando o Estado a aplicar aos culpados as penalidades dispostas pela
legislação em vigor.
O caso anterior, o do apartamento no Guarujá, espelhava claramente essa
hipótese legal, que depois foi repetida quanto ao sítio, talvez porque
naquele momento o ex-presidente se sentisse, e era mesmo, muito
poderoso. Esse extraordinário poder levou-o a incríveis atos de
arrogância, como, por exemplo, quando mandou que o juiz Sergio Moro
enfiasse “num determinado lugar” o processo no qual ele, Lula, figurava
como réu.
Enfim, Lula escolheu brigar e ofender o juiz que posteriormente haveria
de julgá-lo. Não foi muito inteligente nesse episódio, nem quando passou
a acusar o magistrado de agir politicamente, sem atentar para a
circunstância de o processo ter nascido da ação saneadora do Ministério
Público, voltada para a defesa da lei e da ordem.
Não se deve intuir como será a decisão da magistrada encarregada da
sentença, mas, sem qualquer dúvida, a hipótese mais provável é de que
venha uma nova condenação. A rigor, como se trata de um “repeteco” do
processo judicial envolvendo o apartamento no Guarujá, havendo sentenças
finais de Sergio Moro e do Tribunal Regional Federal do Rio Grande do
Sul, não se pode dizer que seja para a juíza um processo difícil de
julgar.
Por isso mesmo talvez não tarde a chegada da nova sentença, até mesmo porque nenhum juiz gosta de ter a imprensa “no calcanhar”.
Caso haja uma nova condenação, deverá ser observado o disposto no artigo
111 da Lei das Execuções Penais: “Quando houver condenação por mais de
um crime, no mesmo processo ou em processos distintos, a determinação do
regime de cumprimento será feita pelo resultado da soma ou unificação
das penas, observada, quando for o caso, a detração ou remição.
Parágrafo único: Sobrevindo condenação no curso da execução, somar-se-á a
pena ao restante da que está sendo cumprida, para determinação do
regime”.
Esse conceito está expresso também no artigo 69 do Código Penal, o qual
dispõe que o agente, se pratica dois ou mais crimes, idênticos ou não,
aplicam-se cumulativamente as penas privativas de liberdade em que haja
incorrido. Essa soma decorre do concurso material dos crimes, ou seja,
quando o agente, mediante mais de uma ação ou omissão, pratica dois ou
mais crimes.
Nesses casos, repete-se, as penas são somadas. Tratando-se de processos
distintos, a soma será feita pelo juízo da execução, que nem sempre é o
juiz prolator da sentença. A soma de condenações tornará mais difícil a
possibilidade de Lula deixar a cadeia após o cumprimento de um sexto da
pena.
*DESEMBARGADOR APOSENTADO DO TJSP, FOI SECRETÁRIO DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO
O Estado de São Paulo
extraídaderota2014blogspot
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