José Casado O Globo
Seria uma reunião de cúpula, não fossem as circunstâncias: Eduardo
Cunha, ex-presidente da Câmara; Sérgio Cabral, ex-governador do Rio,
recém-chegado; Antonio Palocci, ex-ministro dos governos Lula e Dilma;
Marcelo Odebrecht, ex-presidente da Odebrecht; e “Leo” Pinheiro,
ex-presidente da OAS.
O mais velho, Pinheiro (65 anos), é quem mais incomoda vizinhos com disfunções. Está condenado a 26 anos, em regime fechado.
O mais jovem, Odebrecht (48 anos), é quem melhor conhece aquelas celas
apertadas (3m x 4m). Por acordo, sua pena caiu de 19 para dez anos. Fica
preso até a primavera de 2017.
O mais introspectivo é Cunha (58 anos), acusado de suborno num obscuro
negócio da Petrobras na África. Devora o tempo lendo peças de processos
entre a bancada e a cama de alvenaria, de onde enxerga, pelas grades,
pedaço do corredor vazio e os vizinhos de frente.
Depois de 54 dias na cadeia, ele espera ganhar do Supremo um habeas
corpus que lhe permita sair do cativeiro de Curitiba e voltar à
aprazível residência na Barra, no Rio.
Apostava em maioria na segunda turma do Supremo, composta pelos juízes
Gilmar Mendes (presidente), Teori Zavascki (relator), Celso de Mello,
Ricardo Lewandowski e Dias Toffoli. Tinha expectativa de vencer, na
sessão de hoje, por três votos a dois. Ontem à noite, porém, o caso foi
retirado de pauta.
Agora, é provável que o pedido de Cunha seja examinado durante o recesso
do tribunal, que começa na próxima terça-feira, 20, e vai até
fevereiro. A decisão seria de um juiz-plantonista.
Um desfecho favorável a Cunha é aguardado em Brasília como consequência
natural do “entendimento” da semana passada, quando o Supremo evitou
expulsar Renan Calheiros (PMDB-AL) da presidência do Senado — até agora,
ele só está excluído da linha sucessória.
Esse acordo — futuro acórdão — demonstra que juízes de cortes superiores
são políticos de toga. Um dos artífices foi Gilmar Mendes. Estava em
Estocolmo, a dez mil quilômetros de distância, mas exauriu-se em
telefonemas ao Supremo e ao Senado com sugestões, algumas recebidas e
até aclamadas pela defesa do senador-réu.
O interesse na liberação de Cunha é de quem teme efeitos de sua
potencial delação combinados aos da Odebrecht, num ambiente de
instabilidade marcado por aumentos na rejeição ao presidente (20 pontos
em cinco meses) e na desconfiança sobre o rumo da economia.
O governo decodificou a mensagem de Cunha nas 41 perguntas que endereçou
ao presidente Michel Temer, sua testemunha de defesa. O juiz Sérgio
Moro censurou 21 delas, por “inapropriadas” ao processo.
Entre as proibidas, algumas se referiam ao eventual conhecimento de
Temer sobre crimes na Petrobras. Outras indicavam suposto fluxo de
dinheiro de fornecedores da estatal para “eleição de Vossa Excelência ou
do PMDB”. Cunha citou encontros no 377 da Rua Bennett e 470 da Avenida
Antônio Batuíra — casa e escritório paulistano de Temer.
O lenitivo político-judicial a Cunha, se bem-sucedido, seria aplicável a
causas análogas. Beneficiaria outros acusados de corrupção.
Principalmente, chefes políticos insones com a aflição do amanhã, quando
alguém pode aparecer na porta de casa gritando:
— Vem pra cá. Você ganhou viagem grátis para reunião de cúpula com Palocci, Zé Dirceu e Cabral no Paraná.
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