- EDITORIAL ESTADÃO
A firme posição a que
chegaram os países fundadores do Mercosul – Brasil, Argentina, Paraguai e
Uruguai, este depois de um momento de hesitação, ditado por razões de
política interna – a respeito da presidência do bloco neste semestre
impediu que a Venezuela assumisse esse posto. Frustrou-se assim a
tentativa de Nicolás Maduro – cujas consequências eram facilmente
previsíveis, em vista do desastre monumental produzido na Venezuela pelo
regime chavista – de tomar de assalto o Mercosul, valendo-se de
formalismos interpretados espertamente a seu favor.
Valendo-se de
um dispositivo do tratado que criou o bloco, pelo qual a sua
presidência é ocupada, rotativamente, em ordem alfabética, Maduro queria
a todo custo assumir o posto, vencido o período do Uruguai. Só que
acima desse critério, puramente formal, se colocavam dois outros, como
lembraram Brasil, Argentina e Paraguai: o descumprimento de obrigações
que a Venezuela aceitou para integrar o bloco e a grave crise política,
institucional, econômica e social em que está mergulhado o país, e que
impede que Caracas tenha um desempenho minimamente satisfatório na
condução dos negócios do bloco.
Na nota em que anuncia a decisão
de Brasil, Argentina, Paraguai e Uruguai de não passar a presidência do
Mercosul à Venezuela, assinada pelo ministro José Serra, o Itamaraty
lembra que este país não respeitou o prazo de 12 de agosto para cumprir
obrigações impostas pelo bloco, entre elas o Acordo de Complementação
Econômica n.º 18 (de 1991), o Protocolo de Assunção sobre Compromisso
com a Promoção e Proteção dos Direitos Humanos (de 2005) e o Acordo
sobre Residência para Nacionais dos Estados Partes (de 2012).
São,
portanto, compromissos da maior importância – que vão da economia aos
direitos humanos – sem os quais seus parceiros têm todo o direito de
considerar que a Venezuela não reúne condições para integrar o Mercosul e
muito menos para liderá-lo.
No seu lugar, diz a nota, o comando
do bloco neste semestre será exercido por meio da coordenação de seus
membros fundadores, “que poderão definir cursos de ação e adotar as
decisões necessárias em matéria econômico-comercial e em outros temas
essenciais para o funcionamento do Mercosul. O mesmo ocorrerá nas
negociações comerciais com terceiros países ou blocos de países”.
Essa
decisão, para a qual foi fundamental a atuação firme do Brasil, salva o
Mercosul de ser arrastado pelas vagas do populismo e da
irresponsabilidade do “socialismo bolivariano”, que mergulhou a
Venezuela numa das piores crises de sua história. Em agosto, Serra
colocou o dedo na ferida, quando afirmou, com duro realismo:
“Convenhamos que hoje o governo (de Nicolás Maduro) não consegue
governar a Venezuela. Imagine governar o Mercosul”.
A medida que
impediu que o Mercosul fosse colocado na trilha dessa aventura se
impunha como algo evidente desde que Maduro se julgou no direito de
assumir seu comando. Só demorou por causa das hesitações do Uruguai,
onde o presidente Tabaré Vázquez se vê obrigado a agradar a sua base
parlamentar de esquerda, simpática ao regime venezuelano, para conseguir
seu apoio a um indispensável, mas impopular programa econômico de
austeridade. Felizmente, ele optou pelo bom senso e os interesses
maiores de seu país.
O risco de o bolivarianismo comprometer o
Mercosul não foi reduzido apenas porque se evitou que Maduro assumisse
sua presidência rotativa. Os países fundadores foram mais longe:
decidiram que, se a Venezuela não cumprir suas obrigações com o bloco
até a nova data estabelecida, 1.º de dezembro deste ano, ela será
suspensa. É o que certamente acontecerá, dada a clara incapacidade desse
país de fazer o que dele é legitimamente exigido.
A verdade, que
esse episódio torna ainda mais evidente, é que a aceitação da
Venezuela, sob o atual regime, no Mercosul foi um erro grave – pelo qual
se está pagando caro – cometido em 2012 pelo Brasil, Argentina e
Uruguai, então governados por presidentes de esquerda.
extraídadeavarandablogspot




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