Ruy Fabiano:Com Blog do Noblat - O Globo
A degradação da política brasileira, hoje no banco dos réus, mergulhou o
país no vácuo do imponderável. Ninguém arrisca um palpite sobre o dia
de amanhã – na verdade, nem mesmo o de hoje.
De repente, do nada, surge mais uma operação policial, encarcerando um
ou mais notáveis da República, asseclas e operadores, expondo mais
vísceras de algum segmento político-partidário. Ou de todos. Faz dois
anos que isso acontece.
Esta semana, foi a vez do ex-ministro Paulo Bernardo, do PT, que serviu a
Lula e a Dilma. Sua mulher, a senadora Gleisi Hoffmann, continua
servindo – e deve acompanhá-lo, em breve, na desdita.
Em Pernambuco, a Polícia Federal descobriu outra conexão criminosa,
desta vez envolvendo a campanha do falecido ex-governador de Pernambuco e
candidato à Presidência, Eduardo Campos, morto em 2014, num desastre de
avião.
A operação Turbulência descobriu que a aeronave acidentada havia sido
adquirida com dinheiro público roubado. Os financiadores de Campos
mantiveram apoio à campanha da candidata que o sucedeu, Marina Silva. E
Leo Pinheiro, da OAS, em delação, disse que também doou propina da
Petrobras à campanha de Marina.
Amplia-se, pois, o arco partidário sob suspeição pública e investigação
policial. O PSB acaba de integrá-lo. A próxima sucessão presidencial,
com sua inevitável bolsa de apostas, tornou-se tema de videntes e
cartomantes. No campo da ciência política, os dados não autorizam
especulações. A lógica saiu de cena.
As pesquisas de opinião, por isso mesmo, tornaram-se vazias. E não
apenas pela distância do pleito, previsto para 2018 - mas que pode
ocorrer antes (ou nem ocorrer, segundo os mais pessimistas) -, e sim
pela gradual saída de cena dos nomes até aqui tidos como óbvios. Como
não há vazio no poder, hão de surgir outros. Quais?
Depende dos que sobreviverem até lá. E eis aí o temor que se instala.
Num paralelo, a Operação Mãos Limpas, ocorrida na Itália, nos anos 90 –
fonte de inspiração do juiz Sérgio Moro -, também produziu um haraquiri
na política italiana. Mas, por falta de renovação dos quadros dirigentes
de lá – e por um acordo político entre os que dela escaparam – levou a
um desfecho decepcionante. E paradoxal.
Resultou na ascensão de um político burlesco – e corrupto -, Sílvio
Berlusconi, que dominaria a cena política de 1994, quando se tornou
primeiro-ministro pela primeira vez, até 2011, em que finalmente foi
banido, após ocupar por quatro vezes a chefia do governo. Nesse período,
fez aprovar leis que enfraqueceram o Judiciário, submetendo-o ao poder
político.
O resultado é que a corrupção venceu e seu símbolo passou a ser
exatamente um sobrevivente das Mãos Limpas (mesmo sem tê-las), ele
próprio, Berlusconi. Por aqui, há sinais preocupantes.
O presidente do Senado, Renan Calheiros, já se manifestou contra as
delações premiadas, sugerindo que apresentará projeto de lei
restringindo-as. Ninguém duvida que o atual Congresso apoiaria
entusiasticamente tal iniciativa, além de outras, que reduzissem, por
exemplo, os poderes do Ministério Público. Criatividade não falta.
Ao tempo da CPI dos Anões do Orçamento, em 1993/94, em que pela primeira
vez parlamentares cassavam parlamentares, Antonio Carlos Magalhães
reuniu-se com alguns chefes partidários para propor uma saída que
impedisse o que chamou de “guerra de extermínio”. O acordo resultou na
entrega de algumas cabeças coroadas para preservar as demais. Funcionou –
e a nave seguiu.
A diferença é que agora o Congresso não é tribunal, mas banco dos réus.
Há um juiz implacável, que infunde temor até à mais alta Corte, que, por
sua vez, é mais política (e partidária) que jurídica. E há ainda uma
força-tarefa, que envolve policiais federais e procuradores, que exercem
seu ofício com ardor missionário.
É talvez a primeira vez na história que um juiz de primeira instância se sobrepõe aos cardeais da Suprema Corte, pondo-os a nu.
O advento da internet, com suas redes sociais, estabelece ainda poderoso
diferencial: enseja efetiva participação da sociedade, propiciando em
curto prazo mobilizações de massa, em proporções jamais vistas. Foram
necessárias cinco megamanifestações, entre 2015 e 2016, todas
demolidoras contra a classe política e as instituições, para que estas
acreditassem que, afinal, opinião pública existe - e já não é apenas a
opinião publicada.
O mantra de que as instituições estão funcionando é verdadeiro, mas nem
sempre se sabe como e para quem. Sempre funcionaram, mas naquela base.
Não mudou muito, exceto quando temem a contrapartida das ruas. É por aí
que há alguma esperança.
extraídaderota2014blogspot
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