FERNANDO DANTAS O ESTADÃO
Sucesso da política fiscal cimentaria o caminho de substancial redução da Selic
Juro alto é um remédio econômico muitas vezes necessário, mas naturalmente antipático. Nada melhor para um governante, portanto, que iniciar seu governo com corte de juros. Michel Temer provavelmente terá essa sorte. Não será necessariamente no primeiro momento, mas tem tudo para acontecer ainda na fase de aquecimento dos motores do novo governo.
A lógica do argumento não é complicada. Os bancos centrais concentram suas atenções em três fatores principais: os desvios da inflação em relação à meta, o desvio da atividade econômica em relação ao “PIB potencial” (que é quanto a economia pode crescer sem provocar desequilíbrios) e a estabilidade do sistema financeiro.
Cuidar da inflação é a principal atribuição do Banco Central, o que faz com que o primeiro fator tenha um lugar especial dentre os objetivos da instituição. Mas os outros dois não podem ser ignorados. O PIB brasileiro caiu 3,8% em 2015 e a expectativa é de que caia por volta de 3,5% este ano. O desemprego atingiu 11,2% no trimestre até abril, ou 11,4 milhões de pessoas, num salto brutal ante os 8,0% registrados no mesmo período de 2015.
A recuperação judicial da Oi, com R$ 65 bilhões em dívidas, é apenas o maior exemplo das grandes dificuldades financeiras das empresas brasileiros. O sistema bancário, que também lida com inadimplência no crédito ao consumo, vem resistindo até agora sem sinais preocupantes de problemas sistêmicos, mas o prolongamento indefinido da queda do PIB poderia trazer riscos para a estabilidade financeira, que o BC deve resguardar.
O BC tem de pesar os prós e os contras de baixar os juros, e, como visto acima, há claramente fatores que apontam nessa direção. No principal objetivo, porém, que é o da inflação, a coisa se complica. O arcabouço formal do sistema de metas brasileiro indica que o BC deve trabalhar para que o IPCA feche 2017 em 4,5%. Porém, olhando de hoje, nenhum analista acha que esse objetivo será atingido a menos que a taxa básica, a Selic, seja mantida por muito mais tempo no atual nível de 14,25% ou até que seja elevada.
Dessa dificuldade emergiu uma discussão entre analistas e participantes do mercado financeiro sobre a possibilidade de o BC adotar uma “meta ajustada” para 2017, algo entre 5,0% e 5,5%, que poderia ser atingida mesmo que fosse iniciado nos próximos meses um ciclo de redução da Selic.
O economista e consultor Affonso Celso Pastore, ex-presidente do BC, considera que o debate sobre a meta ajustada é, de certa forma, uma filigrana – ligada à estratégia de comunicação – dentro da questão maior da política monetária nos próximos 18 a 24 meses, durante os quais enxerga um ciclo de queda da taxa de juros.
Ele nota que há vários fatores – parte dos quais nada agradável – que ajudarão o BC no seu objetivo principal de controlar a inflação. “O canal de crédito está obstruído”, diz Pastore, referindo-se às dificuldades das empresas e dos consumidores e à postura defensiva dos bancos. Aliás, nos bancos estatais a ordem também é de pisar no freio. O desemprego ainda cresce e a renda do trabalho cai. Todos esses fatores seguram a demanda, e, portanto, a inflação.
E há, finalmente, a política fiscal, que – se o governo Temer conseguir aprovar medidas como o limite dos gastos públicos – também deverá contribuir para conter a demanda. Um efeito adicional do eventual sucesso da política fiscal, notado por Pastore, é o de reduzir o risco Brasil, o que reforça a valorização do câmbio já em curso, que também ajuda a combater a inflação.
A política fiscal, portanto, é a peça fundamental da estratégia de Temer. Se der certo, acaba de cimentar o caminho de substancial redução da Selic. E, neste caso, poucos se importarão se o IPCA chegar aos 4,5% na metade de 2018 e não no fim de 2017. A bola já estará dentro da rede.
COLUNISTA DO BROADCAST E CONSULTOR DO IBRE/FGV
Juro alto é um remédio econômico muitas vezes necessário, mas naturalmente antipático. Nada melhor para um governante, portanto, que iniciar seu governo com corte de juros. Michel Temer provavelmente terá essa sorte. Não será necessariamente no primeiro momento, mas tem tudo para acontecer ainda na fase de aquecimento dos motores do novo governo.
A lógica do argumento não é complicada. Os bancos centrais concentram suas atenções em três fatores principais: os desvios da inflação em relação à meta, o desvio da atividade econômica em relação ao “PIB potencial” (que é quanto a economia pode crescer sem provocar desequilíbrios) e a estabilidade do sistema financeiro.
Cuidar da inflação é a principal atribuição do Banco Central, o que faz com que o primeiro fator tenha um lugar especial dentre os objetivos da instituição. Mas os outros dois não podem ser ignorados. O PIB brasileiro caiu 3,8% em 2015 e a expectativa é de que caia por volta de 3,5% este ano. O desemprego atingiu 11,2% no trimestre até abril, ou 11,4 milhões de pessoas, num salto brutal ante os 8,0% registrados no mesmo período de 2015.
A recuperação judicial da Oi, com R$ 65 bilhões em dívidas, é apenas o maior exemplo das grandes dificuldades financeiras das empresas brasileiros. O sistema bancário, que também lida com inadimplência no crédito ao consumo, vem resistindo até agora sem sinais preocupantes de problemas sistêmicos, mas o prolongamento indefinido da queda do PIB poderia trazer riscos para a estabilidade financeira, que o BC deve resguardar.
O BC tem de pesar os prós e os contras de baixar os juros, e, como visto acima, há claramente fatores que apontam nessa direção. No principal objetivo, porém, que é o da inflação, a coisa se complica. O arcabouço formal do sistema de metas brasileiro indica que o BC deve trabalhar para que o IPCA feche 2017 em 4,5%. Porém, olhando de hoje, nenhum analista acha que esse objetivo será atingido a menos que a taxa básica, a Selic, seja mantida por muito mais tempo no atual nível de 14,25% ou até que seja elevada.
Dessa dificuldade emergiu uma discussão entre analistas e participantes do mercado financeiro sobre a possibilidade de o BC adotar uma “meta ajustada” para 2017, algo entre 5,0% e 5,5%, que poderia ser atingida mesmo que fosse iniciado nos próximos meses um ciclo de redução da Selic.
O economista e consultor Affonso Celso Pastore, ex-presidente do BC, considera que o debate sobre a meta ajustada é, de certa forma, uma filigrana – ligada à estratégia de comunicação – dentro da questão maior da política monetária nos próximos 18 a 24 meses, durante os quais enxerga um ciclo de queda da taxa de juros.
Ele nota que há vários fatores – parte dos quais nada agradável – que ajudarão o BC no seu objetivo principal de controlar a inflação. “O canal de crédito está obstruído”, diz Pastore, referindo-se às dificuldades das empresas e dos consumidores e à postura defensiva dos bancos. Aliás, nos bancos estatais a ordem também é de pisar no freio. O desemprego ainda cresce e a renda do trabalho cai. Todos esses fatores seguram a demanda, e, portanto, a inflação.
E há, finalmente, a política fiscal, que – se o governo Temer conseguir aprovar medidas como o limite dos gastos públicos – também deverá contribuir para conter a demanda. Um efeito adicional do eventual sucesso da política fiscal, notado por Pastore, é o de reduzir o risco Brasil, o que reforça a valorização do câmbio já em curso, que também ajuda a combater a inflação.
A política fiscal, portanto, é a peça fundamental da estratégia de Temer. Se der certo, acaba de cimentar o caminho de substancial redução da Selic. E, neste caso, poucos se importarão se o IPCA chegar aos 4,5% na metade de 2018 e não no fim de 2017. A bola já estará dentro da rede.
COLUNISTA DO BROADCAST E CONSULTOR DO IBRE/FGV
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