Jailton de Carvalho O Globo
O lobista Benedito Oliveira Neto, o Bené, afirmou, a partir de acordo de delação premiada, que Giles Azevedo, um dos mais próximos assessores da presidente afastada, Dilma Rousseff, usou um contrato da Secretaria de Comunicação da Presidência, de R$ 44,7 milhões, para pagar dívidas da campanha de Dilma com a agência Pepper. Segundo Bené, o contrato foi firmado entre a Secretaria de Comunicação e a agência Click, que teria sociedade com a Pepper. É a primeira vez que surge uma denúncia sobre desvio de dinheiro do Planalto para a campanha da presidente.
As informações sobre a delação de Bené foram divulgadas nesta quinta-feira pela revista “Época” e confirmadas ao Globo. Na delação, o lobista disse que soube do uso do contrato da Secretaria de Comunicação para quitar dívidas de campanha a partir de conversa com o governador de Minas Gerais, Fernando Pimentel (PT), em 2014.
Pelas investigações da Polícia Federal, Bené era amigo de Pimentel e operador do esquema dele. Ele teria atuado para arrecadar dinheiro para campanha e intermediar pagamento de propina ao governador.
NOVO INQUÉRITO
Bené falou sobre o contrato da Secretaria de Comunicação nas investigações da Operação Acrônimo, da PF. A partir de agora, a PF deverá abrir um inquérito específico para apurar a veracidade das acusações. A delação do lobista já foi homologada pelo ministro Herman Benjamin, do Superior Tribunal de Justiça (STJ).
Pelo relato de Bené, Danielle Fonteles, uma das donas da Pepper, vinha cobrando há muito tempo o pagamento de uma dívida por serviços prestados à campanha de Dilma em 2010. Num encontro com Pimentel, em 2014, o governador teria dito que Giles iria encontrar a solução para quitar o débito. A Secretaria de Comunicação da Presidência faria contrato com a Click e, a partir daí, repassaria parte do dinheiro à Pepper.
No depoimento, Bené diz: “Fernando Pimentel relatou ao colaborador que Giles Azevedo se propôs a atender ao pedido de Danielle (Pepper) a partir de contratação da agência Click em 2015, na qual a Pepper teria uma participação”.
EM CONFIDÊNCIA
Pimentel teria confidenciado o segredo a Bené momentos depois de se reunir com Giles Azevedo, então chefe de gabinete de Dilma e que foi também um dos coordenadores da campanha da presidente.
. No ano seguinte, em 2015, a Click venceu licitação e levou um contrato de R$ 44,7 milhões para prestar serviços à Secretaria de Comunicação da Presidência (Secom). O lobista disse que não sabe dar detalhes do suposto negócio porque soube do caso por Pimentel e não acompanhou os desdobramentos das negociações.
PIMENTEL CORROMPIDO
Na delação, o operador também acusou Pimentel, de quem era amigo até o início da delação, de receber dinheiro do grupo Caoa, representante da Hyundai no Brasil, conforme revelou O Globo semana passada. Segundo ele, o governador seria destinatário de R$ 20 milhões da representante da montadora.
A propina seria uma retribuição a benefícios concedidos à Caoa no período em que Pimentel estava à frente do Ministério do Desenvolvimento do governo Dilma. Segundo ele, o suborno teria sido negociado com Carlos Alberto de Oliveira Andrade e Antônio Maciel Neto, dois dos principais executivos da montadora. O lobista disse que, em alguns casos, Pimentel recebeu pessoalmente a propina.
CONTA NO EXTERIOR
Bené também afirmou que parte do dinheiro teria sido transferida para uma suposta conta do governador no exterior. Bené teria detalhado, ainda, desvios de verba em obras da Odebrecht na Argentina e em Moçambique financiadas, em parte, com recursos do BNDES, também no período em que Pimentel estava à frente do Ministério do Desenvolvimento.
Bené está preso, mas, em razão do acordo de delação, deverá ser autorizado a acompanhar o restante das investigações em prisão domiciliar.
NOVA DENÚNCIA DE PROPINA
Na delação, Bené também acusou Pimentel de cobrar propina de R$ 5 milhões do grupo JHSF. Em troca, abriria caminho para atuação do grupo no aeroporto Catarina, em São Roque. O lobista disse que, na arrecadação para campanha de Pimentel, chegou a guardar R$ 12 milhões em espécie num apartamento em Brasília. Ele disse ainda que parte do dinheiro arrecadado teria sido usada em outras campanhas do PT.
As investigações sobre os laços entre o governador e o lobista tiveram início logo depois da campanha de 2014. Bené foi detido ao chegar a Brasília, depois de participar da campanha de Pimentel. O lobista e outros ex-funcionários da campanha não souberam explicar a origem de mais de R$ 100 mil em espécie que o grupo trazia em um avião de Bené. A partir de um inquérito aberto para investigar a origem dos recursos não declarados, a PF descobriu ligações financeiras entre Bené e Pimentel.
VIAGENS DO CASAL
Pelas investigações da polícia, o lobista pagou duas viagens do governador com a mulher. Uma viagem aos Estados Unidos e outra ao litoral da Bahia. No período, Pimentel era ministro do Desenvolvimento. Para a polícia, Bené fazia intermediação de negócios de empresas interessadas em decisões do governo federal em nome de Pimentel.
Os negócios renderiam pagamentos para ambos. Com dinheiro recebido da Caoa, Pimentel teria bancado despesas de campanha ao governo de Minas e até se tornado sócio de um grande restaurante.
A partir da delação de Bené, a vice-procuradora-geral da República, Ela Wiecko, deverá aditar a denúncia já formulada contra Pimentel e contra os dirigentes da Caoa por corrupção e lavagem de dinheiro. Também deverão ser abertos novos inquéritos para investigar cada uma das novas denúncias.
Com um vasto currículo de irregularidades, Bené confessou até fraude numa licitação na Universidade de Brasília. A acusação surpreendeu os investigadores, que nada sabiam do caso. Pelo acordo de delação, Bené não pode mentir ou imputar acusação falsa a qualquer pessoa. Caso contrário, poderá perder os benefícios da delação.
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