por Milton Fornazari Júnior Folha de São Paulo
Com o advento da lei 12.850/2013, efetivou-se no Brasil o instituto da
delação premiada. A partir de seu uso em diversas investigações
criminais, surgiram dúvidas acerca dos limites de sua utilização, a fim
de evitar sua banalização.
Na teoria, admite-se a delação de pessoas que ocupam níveis médios nas
organizações criminosas e possuem conhecimento de fatos e de provas do
envolvimento daqueles que ocupam o topo da pirâmide criminosa.
A grande vantagem para o Estado e para a sociedade é que esse mecanismo
permite a troca da punição de um criminoso médio pela obtenção de provas
que permitirão a responsabilização penal dos "grandes criminosos", ou
seja, daqueles que detêm o poder de comandar todo o esquema delituoso.
Quanto maiores a quantidade e a qualidade das informações prestadas,
maior será o benefício obtido pelo investigado, devendo-se ter cuidado
para que essa técnica de investigação, tão importante no combate a
esquemas complexos de corrupção e de crimes financeiros, não seja
esvaziada pela ausência de punição às pessoas que se situam no topo da
cadeia criminosa.
Na corrupção, em regra geral, a prática criminosa reina em duas frentes
distintas, mas codependentes: o poder econômico (corrupção ativa) e o
poder político (corrupção passiva).
Após a investigação progredir na obtenção das provas que levem à punição
daqueles que ocupam os ápices das organizações, tanto na frente
política como na econômica, não se deve mais tolerar a
responsabilização penal de apenas um desses lados.
responsabilização penal de apenas um desses lados.
Deixar de punir os dois polos da organização criminosa -político e
econômico-, para punir apenas um deles, implicaria dar tratamento
distinto a situações jurídicas idênticas, o que geraria a sensação de
injustiça.
Nesse sentido, é importante destacar que as penas de prisão previstas no
Código Penal aos crimes de corrupção ativa e de corrupção passiva são
iguais.
Não obstante, ainda nesses casos pode ser admitida a delação premiada, conquanto dois requisitos básicos sejam preenchidos.
São eles: a) deve haver amplo e irrestrito esclarecimento de todos os
fatos criminosos e, principalmente, b) os benefícios concedidos ao
chamado "grande criminoso" devem ser mínimos, para que ele não se isente
do cumprimento da pena por meio de rápidas progressões de regime ou
pela prisão domiciliar.
Destaca-se, por fim, que a investigação de crimes graves, como define a
Convenção da ONU de Palermo, deve se voltar para o esclarecimento de
todos os fatos e, especialmente, para a responsabilização das pessoas no
topo da cadeia criminosa.
Por esse motivo, é fundamental evitar a banalização da delação premiada e
das barganhas desproporcionais para os chefes das organizações
criminosas, seja no polo do poder econômico, seja no poder político.
MILTON FORNAZARI JUNIOR, doutor em direito processual penal
(PUC-SP), é delegado da Polícia Federal. Atua na Delefin (Delegacia de
Repressão a Crimes Financeiros e Desvio de Recursos Públicos).
extraídaderota2014blogspot
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