editorial da Folha de São Paulo
Citada com bastante frequência, a frase de um juiz da Suprema Corte
americana mesmo assim merece ser relembrada. "A luz do sol é o melhor
desinfetante", dizia Louis Brandeis (1856-1941), talvez sem imaginar
quanto da máquina estatal seria necessário expor aos efeitos
purificadores da publicidade.
O valor da transparência só fez crescer desde que a tese foi enunciada,
uma vez que também se expandiram a abrangência e a complexidade do
sistema público.
Some-se a isso a multiplicação dos meios cibernéticos de pesquisa e
talvez estejamos vivendo espécie de "crise de transparência", cujo
efeito tende não só a uma purificação de longo prazo mas também a uma
intensa –e, espera-se, provisória– sensação de desalento.
Nada se diga (desta vez) a respeito dos políticos brasileiros.
Autoridades investigativas e da Justiça têm procurado derrubar e punir
os abusos no trato do dinheiro público e as pretensões dos que, no
governo ou na oposição, ostentam seu moralismo de fachada.
Devido a esse importante papel no combate à corrupção, as instituições
ligadas à esfera do Judiciário têm sido vistas pela população com muito
mais respeito do que as associadas aos demais Poderes.
Até mesmo por isso, provoca inconformismo e mal-estar a notícia, publicada nesta Folha,
de que 10 dos 33 ministros do Superior Tribunal de Justiça (STJ) têm
filhos ou mulheres advogando em causas julgadas pela própria corte.
A suspeição que essa circunstância projeta sobre o STJ não é
negligenciável; para a corregedora nacional de Justiça, Nancy Andrighi,
trata-se de "uma das mais nocivas práticas existentes" no Judiciário.
Torna-se ainda mais grave, naturalmente, quando envolve um dos tribunais
mais relevantes do país.
Verdade que resolução do Conselho Nacional de Justiça, reafirmada no
novo Código de Processo Civil, proíbe expressamente que magistrados
votem em processos de interesse de cônjuges e parentes.
Ainda que a vinculação possa ser indireta num colegiado de 33 membros,
abre-se a possibilidade de um cruzamento de favores: o pai de um
advogado no processo X vota no julgamento Y, em que milita a esposa de
um colega –e este retribui a gentileza.
Constitui-se uma rede de comprometimentos familiares e estamentais,
viciando um sistema que deveria ser marcado acima de tudo pelo
equilíbrio e pela isonomia.
Talvez seja impossível impedir essa rede de compadrio, pois sempre pode
se formar com laços cada vez mais remotos. O mínimo, entretanto, seria
um controle mais efetivo quanto a impedimentos diretos, que, hoje, às
vezes passam em brancas nuvens no tribunal.
A luz do sol, como se vê, chega em boa hora ao STJ.
extraídaderota2014blogspot
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