Disputa adoidada a respeito do programa de saúde de Obama paralisa política e ameaça economia do país
PARTE DO governo federal americano pode fechar a partir de hoje por falta de fundos para pagar despesas. Pode fechar porque o ano fiscal terminou, e a Câmara de Deputados deles não tinha aprovado o novo Orçamento pelo menos até quando esta coluna era escrita, às 20h30.
A maioria da Câmara é de deputados do Partido Republicano, ora dominado politicamente pela facção Tea Party, de direita dura e crua. Os republicanos exigem, grosso modo, que o governo democrata reduza tamanho e custo do programa de saúde que chamam de "Obamacare" (ObamaSUS, em tradução livre), única grande realização de Obama, aprovado em 2010 no Congresso e referendado quase integralmente pela Suprema Corte em 2012.
Sem isso, nada de Orçamento. Sem isso e sem o adiamento do início do "Obamacare" para 2014, também não aprovam o novo limite de endividamento do governo, que ficaria sem dinheiro para pagar sua dívida por volta de 17 de outubro.
Afora o ridículo e os prejuízos para cidadãos americanos, o fechamento do governo por algumas semanas não faz diferença para a economia dos EUA ou a do resto do mundo. Mas, se a ameaça de um inédito calote americano persistir, o mundo financeiro ficará tenso, consumidores e empresários ficarão apreensivos e uns décimos de crescimento irão para o ralo. Na hipótese de calote, não dá nem para pensar o que vai acontecer.
Em 1995 e 1996, governo Clinton, o governo fechou. Não aconteceu nada. De 2011 a 2013, os republicanos impuseram derrotas a Obama, limitando gastos do governo e parte do crescimento de curto prazo.
O que quer o Tea Party, composto majoritariamente de homens, brancos, mais velhos, conservadores em termos comportamentais, quando não fundamentalistas cristãos, e em geral moradores de Estados mais pobres e/ou do Sul? Entre outras coisas, um retorno ao passado de governo pequeno em gasto e interferência na vida dos indivíduos. Grosso modo, isso é impossível.
O grosso do gasto americano é em Medicare (assistência médica pública para idosos), Medicaid (para pobres), Previdência (aposentadorias etc.) e Defesa. Os programas de saúde e previdência são populares e "imexíveis" praticamente desde que foram criados, nos anos 1930. Os de Defesa, com mais ou menos despesa, mantêm o império (e o Tea Party não quer mexer muito aí).
O que sobra? Gastos na margem, ou adicionais, e leis federais, regulamentações (ambientais, comportamentais, outras do gênero).
O "Obamacare" é um programa que pretende incentivar americanos pobres (que não têm cobertura alguma) a terem seguro de saúde e um plano de barateamentos; estende benefícios do sistema público.
Dá subsídios para quem fizer plano de saúde e penaliza por meio tributário quem não fizer. Incentiva a mutualização. Isto é, reunião de segurados ou de grupos de segurados de empresas pequenas. Mais gente segurada divide riscos e barateia os planos de saúde, que de resto terão de cobrir doenças pré-existentes e dependentes até 26 anos de idade.
Republicanos chamam isso de "socialismo" (palavrão, nos EUA), pelo caráter de "mútuo" e pelo fato de o plano ser quase compulsório. Mas empresas privadas, não o governo, vão oferecer o serviço. É esse o arranca-rabo americano.
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