por Eduardo Affonso
Precisamos de mais médicos. E mais arquitetos, mais dentistas, mais artistas, mais professores — até mais operadores de telemárquetim,
ainda que isso possa parecer controverso. A questão da saúde, porém, é
que é dramática. E se, como dizia o sociólogo Betinho, “quem tem fome
tem pressa”, quem sente dor também tem.
A mão de obra para suprir essa demanda sempre esteve disponível aqui
mesmo — nem precisaria ser estrangeira, ou terceirizada por alguma ilha
caribenha. Mas... por que não?
Para certas coisas, não deveria haver fronteiras.
Para certas coisas, não deveria haver fronteiras.
Acontece que o Mais Médicos — assim como o Bolsa Família — é daqueles
casos de programa bom que quase se perdeu por causa das más companhias.
Seu objetivo (na teoria...) não era apenas possibilitar que o médico
fosse aonde o povo estava, mas também qualificar profissionais, ampliar o
número de vagas de graduação e residência, valorizar a atenção básica.
Ou seja, veio de fábrica com as melhores intenções — das quais a
política está cheia. E, na prática, embutia o financiamento velado a um
país irmão camarada, por meio daquela mão boba em 70% do salário. E
incluía diplomas não validados. E restrições aos direitos fundamentais
de opinião, de associação, de ir e vir, de vir e ficar. E, para
completar, prefeituras de cidades ricas do Sul e do Sudeste que
preferiam demitir profissionais e transferir para si recursos humanos e
materiais muito mais necessários no Norte e no Nordeste.
Por isso, a “crise” com o governo de Cuba não poderia ser mais saudável.
Ela põe a nu um problema e permite atacá-lo de vez, além de
redirecionar o programa para aquilo a que ele efetivamente deveria se
destinar: o atendimento à população mais pobre, não a interesses
ideológicos ou eleitorais. Principalmente agora que se sabe que a ideia
do programa partiu de Cuba, que o valor inicialmente cobrado por
profissional era de US$ 8 mil (depois de barganhar, o Brasil fechou
negócio por 5 mil) e que eventuais pendências judiciais terão que ser
decididas em... Havana. Muy amigos.
Os cubanos que não desertarem deixarão o país antes da posse do novo
governo; os demais estrangeiros não têm por que ir embora, já que vieram
por vontade própria.
Deixariam também algo em torno de 20 milhões de brasileiros desassistidos. Ou não.
Deixariam também algo em torno de 20 milhões de brasileiros desassistidos. Ou não.
Poucas horas depois do lançamento do novo edital, já havia inscritos em
número suficiente para preencher quase a metade das 8.517 vagas abertas
(ou, talvez, todas — se o sistema não tivesse — adivinhe! — entrado em
pane).
Por sorte, Cuba não exporta também professores (operadores de telemárquetim, então,
nem pensar, já que centrais de venda e de atendimento ao consumidor não
são o forte por lá). Nesse caso, teríamos que lidar com outra
debandada, e mais lenha na fogueira da “escola sem partido”.
É que carecemos também de escolas com partido — o da pluralidade.
Escolas que abordem as regras do jogo democrático da mesma forma que
fazem com as das partidas de futebol — manhas e fintas fazem parte, mas o
importante é o ferplêi.
Que expliquem que faltas precisam ser punidas e que o impedimento — por
complicado que pareça — não é golpe. Que não há quem seja sempre o
campeão moral, ganhando ou perdendo. Que o juiz não pode usar a camisa
de uma das equipes, ser sócio torcedor ou comemorar um gol.
Que é melhor ser a escola de todos os partidos (ou todos os times, para
manter a metáfora) que ser de partido nenhum, ou de um partido só.
E precisamos, sim, de mais operadores de telemárquetim. As centrais de atendimento (não achei ainda uma forma aceitável de aportuguesar “call center” )
funcionam como porta de entrada no mercado de trabalho, a primeira
oportunidade de renda para milhares de jovens (o assistencialismo não é a
única ou a melhor forma de inclusão).
Enfim, precisamos de muitos novos postos de trabalho (quem está
desempregado também tem pressa), de mais médicos (sem nenhum direito a
menos), de mais professores (sem nenhum propósito a mais que não seja o
de educar). E de menos (mu)tretas.
O Globo
extraídaderota2014blogspot
0 comments:
Postar um comentário