editorial do Estadão
Não se arruína o país que detém as maiores reservas de petróleo do mundo sem despender imensa quantidade de energia para instalar e manter uma ditadura voltada, antes de tudo, para o enriquecimento de seus próceres. A Venezuela hoje é um país pobre, a ponto de a esmagadora maioria de seu povo amanhecer sem saber se conseguirá alimento para mais um dia.
Milhares de famílias venezuelanas têm sido separadas porque pais se sentem obrigados a entregar seus filhos para orfanatos por não terem mais condições de lhes prover o mínimo para sobrevivência. Muitos também o fazem para se lançarem aos riscos de buscar uma nova vida em outros países, inclusive no Brasil. Este drama humanitário, uma tragédia sem precedentes na história recente da América Latina, é obra do regime instalado por Hugo Chávez e mantido desde sua morte, em 2013, por seu pupilo, Nicolás Maduro, sob condições perversas para o povo.
A terrível história do saque do país, praticado pelo chavismo, está prestes a ser revelada em detalhes por um dos mais graduados membros do regime. Alejandro Andrade, ex-guarda-costas de Chávez, homem que por anos cuidou pessoalmente da segurança do ex-ditador, assinou um acordo de colaboração premiada com as autoridades americanas a fim de manter o regime de prisão domiciliar a que está submetido nos Estados Unidos desde o final do ano passado.
Sobre Andrade paira a acusação de ter lavado cerca de US$ 1 bilhão por meio de um esquema ilegal de câmbio concebido para esconder as vultosas propinas recebidas por autoridades venezuelanas ligadas ao chavismo. Entre elas o próprio ex-guarda-costas, que, além das informações que tem prestado aos investigadores americanos, teve de entregar às autoridades judiciárias dos EUA um avião, cavalos de raça, relógios de luxo e propriedades.
Para dar conta da “missão” de lavar o dinheiro recebido a título de propina pela camarilha chavista, Alejandro Andrade foi alçado por Chávez de sua posição de guarda-costas à nada menos do que a de chefe do Tesouro Nacional. Estima-se que Andrade teve poder sobre a movimentação de contas bancárias que acumularam a estonteante quantia de US$ 14 bilhões. Não por outra razão, é considerado o “delator n.º 1” pelas autoridades dos EUA que buscam comprovar o enorme esquema de corrupção na Venezuela.
O Estado teve acesso a documentos que constam do processo aberto contra Andrade pelas autoridades dos EUA, país onde fixou residência há cinco anos, após a morte do ex-chefe. O processo revela que milhões de dólares foram transferidos pelo banco HSBC, na Suíça, para os EUA com o objetivo de custear uma vida de luxo não só para Andrade, mas também para cerca de 20 diretores e ex-dirigentes da PDVSA, a estatal venezuelana de petróleo.
Em agosto, a Justiça dos EUA já havia confiscado bens de luxo - incluindo imóveis, carros e iates - localizados na Flórida, pertencentes a uma casta de ex-funcionários públicos e empresários ligados ao governo de Hugo Chávez. O confisco se deu após a prisão do ex-banqueiro Matthias Krull, alemão que trabalhava no banco suíço Julius Baer. Ao Departamento de Justiça dos EUA, Krull “admitiu culpa em uma denúncia de conspiração para cometer lavagem de dinheiro”. De acordo com os termos de sua colaboração premiada, o ex-banqueiro foi responsável por um esquema que lavou US$ 1,2 bilhão para autoridades e empresários venezuelanos ligados ao chavismo.
O dinheiro movimentado pela quadrilha chavista, ao menos a quantia apurada até agora, é quatro vezes superior ao que a ONU pede para atender aos refugiados venezuelanos espalhados por oito países da América Latina. Isso apenas dá a dimensão do drama humanitário que desafia a compreensão de qualquer um dotado de boa-fé e compaixão.
O acordo de colaboração premiada assinado por um graduado membro do regime chavista, como Alejandro Andrade, representa um duro golpe contra a ditadura venezuelana.
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