por José Casado O Globo
Joesley: “Só essa partezinha da fita do Ciro… Só a partezinha de que vai
derrubar a Lava-Jato.” Ricardo: “Podemos falar: Ó, tem um vídeo… Dando
dinheiro pra ele”
O gelo tilintava nos copos. Bebiam, comiam e gravavam a conversa sobre a
compra de políticos, entre eles o senador piauiense Ciro Nogueira,
presidente do Partido Progressista, e o ex-deputado paulista Valdemar
Costa Neto, que controla o Partido da República (PR).
O empresário Joesley Batista ria ouvindo o executivo Ricardo Saud falar
sobre um suborno de R$ 45 milhões ao senador Nogueira, em março passado,
no Rio:
— Falei: “Olha, não pega o dinheiro da Odebrecht, não. O Antonio Carlos
veio aqui e me contou, que estão pagando lá no exterior. E que o
Valdemar Costa Neto está recebendo no exterior”.
Ricardo Saud não identifica “Antonio Carlos”, mas as circunstâncias
sugerem ser Antonio Carlos Rodrigues, ex-senador paulista e ex-ministro
de Dilma Rousseff. No papel, Rodrigues é presidente do PR. Na vida real,
é um escudeiro de Valdemar Costa Neto.
Valdemar, conhecido como “Boy”, é quase uma lenda no submundo da
política. Coleciona seis mandatos de deputado por Mogi das Cruzes (SP),
além de duas renúncias.
Uma foi em 2005, quando foi acusado de corrupção no mensalão. Na época,
sua mulher contou no Congresso como ele havia recebido R$ 40 milhões do
PT, e embolsado R$ 10 milhões.
Outra foi em 2013, quando sentenciado por corrupção e lavagem de
dinheiro a sete anos de prisão — com multa de R$ 1,6 milhão sobre um
patrimônio declarado de R$ 2,5 milhões.
Passou um ano no Presídio da Papuda, em Brasília, atual endereço da
dupla Joesley e Ricardo. Da cela, Valdemar conduziu o PR na eleição de
2014 auxiliado por Rodrigues.
No fim de 2014, quando o Supremo o mandou à prisão domiciliar, já
comandava uma bancada de 38 deputados e quatro senadores do PR. Dilma
Rousseff deu-lhe o Ministério dos Transportes. Valdemar indicou
Rodrigues.
Ciro e o PP, Valdemar e o PR são onipresentes nas principais
investigações sobre corrupção na última década e meia — do mensalão às
fraudes em agências reguladoras; das propinas da Odebrecht às da JBS,
entre outros.
Ciro acaba de ganhar de Michel Temer a estratégica secretaria do Cade,
onde são decididas fusões, aquisições e incorporações entre grandes
empresas, além de bilionários acordos de leniência como os da Odebrecht e
da JBS.
“Boy”, enquanto isso, se dedica a uma nova empreitada: a construção de
mais um partido. Nos próximos dias a Justiça Eleitoral deve autorizar o
“Muda Brasil” de Valdemar a funcionar. Será o 36º partido político. Ele
já tem o PR, que recebe R$ 48 milhões anuais via Fundo Partidário,
receita equivalente à de uma empresa de médio porte. É dinheiro público,
sem risco, e com acesso ao rádio e à televisão garantido por lei
durante as eleições.
— Essa turma não está em outro planeta? — perguntou Joesley Batista a
Ricardo Saud, na autodelação gravada de seis meses atrás, agora em poder
do Supremo. — Pai do céu. Que dois mundos diferentes, né?
Ironizou:
— Ricardo, se “nós mostrar” só essa partezinha da fita do Ciro, sem as
outras putarias… Só a partezinha de que vai derrubar a Lava-Jato… Nossa
senhora… Já pensou?
O executivo começou a rir:
— E nós ainda podemos falar o seguinte: “Ó, tá aqui, olha, tem um vídeo… Dando dinheiro pra ele.”
extraídaderota2014blogspot
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