No
Brasil, mais de 20,5 milhões de trabalhadores recebem de seus patrões
algum tipo de subsídio para a alimentação. Em troca, empresários recebem
do governo o direito a reduções de impostos e outros encargos, graças
ao Programa de Alimentação do Trabalhador, instituído em 1976, e que
hoje conta com mais de 250 mil empresas cadastradas.
Na
maioria dos casos, o popular tíquete-refeição recebido por muitos
brasileiros é destinado às despesas em dias de trabalho. No entanto, os
nobres membros do Congresso Nacional formam a casta superior, agraciada
com a generosa Cota Para Exercício da Atividade Parlamentar, já abordada
pelo Spotinks neste vídeo.
Legalmente, a verba deveria ser usada apenas para gastos diretamente
relacionados ao mandato do congressista, mas, na prática, acaba bancando
gastos que vão muito além disso. Recentemente, revelamos como o
deputado Silvio Costa (Avante-PE) usou o “cotão” para financiar gastos
com telefones durante sua campanha em 2014.
Mas os
abusos não param por aí. Por meio dos dados abertos da Câmara,
investigamos como os ilustres parlamentares têm gastado o cotão aos
finais de semana. Para esta análise, nos concentramos apenas em despesas
de alimentação, combustível, hospedagem, táxi, pedágio e
estacionamento. Retiramos da conta, também, os fornecedores de passes
automáticos de pedágio. O filtro se dá porque a data de emissão dos
cupons e notas fiscais destes serviços é referente exatamente ao momento
do gasto, o que pode não acontecer com outros prestadores. Somente em
2017 já foram mais de R$ 2,6 milhões gastos com o reembolso de 19,4 mil
notas emitidas ao sábados e domingos por deputados federais.
Confira abaixo tudo que você precisa saber sobre como os políticos estão torrando seu dinheiro.
Os campeões dos gastos aos finais de semana.
Ao todo, encontramos registros de 471 deputados utilizando
a Cota Parlamentar aos finais de semana. No entanto, a prática não
parece ser comum a todos. Do total de gastos, quase metade (46%) se
concentra nos 20% mais gastões: um grupo de 94 parlamentares que já
deixou uma conta de R$1,2 milhão para o pagador de impostos, com o
reembolso de quase 9 mil notas fiscais. Na média, um membro desse clube
custou R$ 13 mil em 2017, até a última atualização dos dados da Câmara.
O PT é o
líder dos gastos, tanto em números absolutos quanto proporcionais:
foram R$ 464,4 mil, com uma média de R$ 8,2 mil por parlamentar. Entre
os três primeiros, dois são do PT e um representa o Podemos. E não é um
mero acaso que dois deles sejam do Rio Grande do Sul e um de Santa
Catarina: os dois estados possuem a maior média de gastos por
parlamentar em finais de semana da Câmara. Veja os dados do painel a
seguir:
A farra é
liderada por Marcon (PT-RS), que já foi reembolsado em R$ 22,3 mil por
conta de 166 gastos “para exercício da atividade parlamentar” em sábados
e domingos. Foram R$ 14,5 mil somente com paradas para reabastecimento
de veículos, como o dessa nota fiscal, que detalha a compra de 160,67
litros de óleo diesel em Ronda Alta, no interior do Rio Grande do Sul.
Com essa quantidade de combustível, daria para viajar para Porto Alegre
três vezes usando a picape Ford F-250 que o parlamentar declarou ao TSE
em sua relação de bens de 2014.
Marcon é
seguido de perto por seu colega gaúcho, Cajar Nardes (Podemos), que já
consumiu R$ 21,8 mil em 220 notas fiscais. Só com alimentação, foram R$
5,7 mil. Na tarde do dia 15 de julho, um sábado, Nardes visitou uma
conhecida churrascaria porto-alegrense, o “Costela no Roletche”, onde
deixou uma fatura de R$ 140,00 para o pagador de impostos. A nota fiscal
não ajuda a desvendar o consumo do parlamentar nesse dia, visto que
traz apenas uma descrição genérica – “almoço” – o que não é permitido
pelo próprio regulamento da Câmara sobre o cotão.
No
entanto, a página do restaurante no iFood traz mais informações sobre os
preços do estabelecimento. Por lá, um “kit para uma pessoa” custa R$
60,90, e serve uma farta refeição: costela de novilho ou suíno 500g de
carne, salada de batata, salada verde (rúcula, agrião e alface), salada
de cebola fatiada, tomate fatiado, farofa ou farinha.
Com os
R$ 140, daria pra comprar dois pratos como esse e ainda sobraria
dinheiro para uma sobremesa. Mas, nos finais de semana, Nardes não quer
só comida. Ele quer combustível (R$ 8,9 mil), hospedagem (R$ 5,7 mil),
táxis, pedágios e estacionamentos (R$ 1,4 mil) pagos pelo povo
brasileiro.
O painel abaixo traz o ranking completo
dos parlamentares que gastam a Cota Parlamentar aos finais de semana.
Melhores visualizados no computador, os gráficos trazem o detalhamento
das despesas totais, oferecendo a possibilidade de filtrar por deputado.
Deputados da Bancada Evangélica trabalham aos domingos.
As
religiões da tradição cristã adotam como dogma que seus fiéis devem
guardar o domingo para o descanso e a adoração a Deus. Algumas
interpretações da Bíblia recomendam que o sábado deve ser preservado,
assim como na tradição judaica. Seja como for a regra seguida pelas
diferentes ramificações religiosas dos parlamentares evangélicos, a
maioria dos deputados da Frente Parlamentar Evangélica utiliza a Cota
Parlamentar aos sábados e domingos.
Dos 185
integrantes da bancada que aparecem nos registros da Cota Parlamentar,
148 solicitaram reembolsos aos domingos e 155 aos sábados. Nos domingos,
foram mais de R$ 389 mil desembolsados em 3,3 mil notas fiscais dos
evangélicos. Aos sábados, a quantia foi bem maior: R$ 551,9 mil diluídos
em 4,1 mil notas.
Refeições que alimentariam um batalhão de crianças.
Os R$
123,1 mil gastos pelos nobres parlamentares apenas com alimentação podem
parecer pouca coisa, quando tomamos como referencial o montante do
orçamento público. Mas não é bem assim: em vez de transferir renda para a
classe política, essa verba poderia estar sendo utilizada, por exemplo,
com alimentação escolar. Tomando como base o valor da merenda usado
pelos cálculos da ferramenta “De Real para Realidade” do Estadão (R$
2,22), o valor seria suficiente para servir 55.495 refeições a alunos da
rede pública de ensino.
Por
falar em Bancada Evangélica, a refeição mais cara registrada pela Câmara
em finais de semana é do deputado Pastor Luciano Braga (PRB-BA), que
resolveu almoçar no Hotel Morubixaba (Barreiras/BA) ao custo total de R$
278,85, ou 125 merendas. O almoço aconteceu no dia 8 de outubro, um
domingo. Para piorar: a nota fiscal não traz nenhum detalhamento do que
foi consumido:
Um dia
antes, em São Paulo, acontecia outra “refeição” salgada. Dessa vez, o
Deputado Marcos Soares (DEM-RJ) colocou seu almoço de sábado, no valor
de R$ 254,80, na conta do eleitor, sem dar maiores detalhes do que foi
consumido. Mas há que se fazer justiça: o valor total da nota foi de R$
255,64, o que significa que o parlamentar usou 0,002% de seu salário
para cobrir a despesa.
Confira a
seguir o ranking das refeições de fim de semana pagas pelo contribuinte
brasileiro. Caso queira investigar outros gastos suspeitos de
deputados, conheça também a Operação Serenata de Amor, que programou um robô para identificar desvios de dinheiro público da Cota Parlamentar.
EXTRAÍDADESPOTNIKS.COM
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