editorial do Estadão
O vazamento da delação de Joesley Batista na semana passada deixou uma
vez mais o País profundamente consternado, ao envolver em ações
criminosas graduados personagens da vida nacional, a começar pelo
presidente da República, Michel Temer. Surpreende que denúncias tão
graves tenham sido divulgadas – assumindo, assim, ares de veracidade –
sem que nada do que delas consta, e tampouco as circunstâncias que
envolvem os fatos, tenha sido averiguado previamente. Tal açodamento
foi, no mínimo, irresponsável. Haja vista as consequências da divulgação
nos campos político, econômico e financeiro.
A delação do empresário da JBS é escandalosa, e não apenas pelos crimes
relatados. As histórias que a cercam são de enorme gravidade, indicando,
no mínimo, o pouco cuidado com que se tratou um material com enorme
potencial explosivo para o País.
Em primeiro lugar, causa escândalo o fato de que a principal notícia
vazada na noite de quarta-feira passada não foi confirmada e, mesmo
assim, o Ministério Público Federal (MPF) não fez qualquer retificação.
Foi afirmado que um áudio gravado por Joesley Batista provava que o
presidente Michel Temer havia dado anuência à compra do silêncio de
Eduardo Cunha e de Lúcio Funaro. Ainda que a conversa apresentada seja
bastante constrangedora para o presidente Michel Temer pelo simples fato
de ter sido travada com alguém da laia do senhor Joesley Batista, das
palavras ouvidas não se comprova a alegada anuência presidencial. Ou
seja, aquilo que tanto rebuliço vem causando na vida política e
econômica do País desde a semana passada não foi comprovado e, pelo
jeito, não o será, pelo simples fato de não existir.
Como o Broadcast – serviço de notícias em tempo real da Agência Estado –
revelou no sábado passado, a gravação da conversa entre Joesley Batista
e Michel Temer no Palácio do Jaburu não foi periciada antes de ser
usada no pedido de abertura de inquérito contra o presidente. Ou seja,
nem mesmo essa medida de elementar prudência foi adotada pelo Ministério
Público Federal. Em razão de a denúncia envolver altas personalidades,
seria curial dar os passos processuais com extrema segurança, até mesmo
para evitar eventual nulidade da ação e consequente impunidade dos
eventuais culpados. Tudo indica, no entanto, que o principal objetivo do
MPF era obter notoriedade, e não fazer cumprir a lei.
A fragilidade da delação de Joesley Batista não se esgota nesses pontos.
De forma um tanto surpreendente, o MPF não apresentou denúncia contra o
colaborador, como se a revelação dos supostos crimes cometidos pelo
presidente da República e por outros nomes importantes da vida nacional
fosse suficiente para remir a pena do criminoso confesso. Trata-se de
evidente abuso, a merecer pronta investigação da Justiça. Se, como o MPF
denuncia, os crimes foram tão graves e abrangem toda a política
nacional, é um grave e escandaloso erro – para dizer o mínimo – conferir
perdão a quem os perpetrou e lucrou abundantemente. Note-se que a lei
proíbe que se dê imunidade aos líderes de organização criminosa. Não
seria essa a função dos senhores Joesley e Wesley Batista nos
acontecimentos em questão?
Além disso, até o momento não foi apresentada uma possível razão que
justificasse o procedimento seguido pelo MPF e pelo Supremo Tribunal
Federal (STF) em relação à delação de Joesley Batista. Como não estava
ligado à Operação Lava Jato, o caso deveria ter sido distribuído por
sorteio, e não encaminhado diretamente ao ministro Edson Fachin.
A delação de Joesley Batista ainda expõe o Ministério Público em dois
pontos muito sensíveis. O delator contou que o procurador Ângelo Goulart
Villela, mediante pagamento de R$ 50 mil mensais, era seu informante
dentro do MP. Ora, tal fato leva a checar com lupa todos os passos do
empresário nesse processo de colaboração. Além disso, um procurador da
República, que atuava muito próximo a Rodrigo Janot, deixou a
Procuradoria-Geral da República (PGR) para trabalhar no escritório que
negocia com a própria PGR os termos da leniência do Grupo JBS. Tudo isso
sem cumprir qualquer quarentena.
Ansiosamente, o País espera que avance o combate à corrupção. Tal avanço deve ser feito, porém, de forma menos descuidada.
extraídaderota2014blogspot
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