por Igor Gielow Folha de São Paulo
João Doria, o prefeito tucano de São Paulo, é candidato à Presidência da
República em 2018. Pode até não concorrer. Tudo depende de fatores que
vão da viabilidade de seu padrinho, o governador Geraldo Alckmin
(PSDB-SP), à sempre inerente, para um político, possibilidade de ser
abatido em voo. Mas hoje é presidenciável.
Se o pleito do ano que vem está sendo desenhado pela tinta de canetas
que assinam despachos no Judiciário e preenchem autos de apreensão
policial, a eventualidade da disputa com um Doria isolado das agruras da
Lava Jato insinua uma campanha calcada na promessa de uma "Presidência
Público-Privada".
Não falo apenas da multiplicidade de recursos ao empresariado, em busca
de doações ou programas mais estruturados, empreendidos por Doria. O
movimento parece ser bem mais amplo do que uma propaganda gratuita em jogo do Brasil, por mais simbólico que isso seja.
Na noite de segunda (27), o prefeito conseguiu reunir em São Paulo a nata do sistema bancário para prestigiar um evento sobre
criação de creches. Foi tão ou mais eloquente do que o convescote com
seus pares da elite mais estrelada paulistana, ocorrido na semana
passada e no qual só não foi lançado candidato porque Alckmin estava
presente.
Toda a indicação no entorno do prefeito é de que ele vai aprofundar a
simbiose com o empresariado e fazer dela uma pedra de toque, seja de seu
mandato, seja numa corrida eleitoral. O problema mais óbvio da
estratégia é que, afinal de contas, estamos no Brasil.
Como o que já vazou das delações da Odebrecht deixa claro, a relação dos
donos do dinheiro com os do poder é antiga e patológica. No Planalto, o
PT criou sua modalidade de "Presidência Público-Privada", com rios de
corrupção a irrigar o que na superfície era uma falsificação dos
conglomerados de "campeões nacionais" de lugares como a Coreia do Sul e a
França.
Deu no que deu. O petrolão destruiu o PT. O voluntarismo de seu último
esbirro de governo, a gestão Dilma Rousseff, pôs a pá de cal no projeto
ao desmilinguir a economia. A sigla esperneia por sua enésima
reinvenção, amparada, como sempre, na figura de Luiz Inácio Lula da
Silva.
Um argumento de apoiadores do prefeito é que o próprio arcabouço lançado
pela Lava Jato impedirá qualquer malfeito numa relação renovada. O
próprio Doria já pontuou o que deve ser seu discurso sobre o caso: diz
que faz tudo à luz do dia.
Pode ser, mas além de dúvidas sobre favorecimentos pouco impessoais, a
prudência recomendada pelo histórico brasileiro sempre dará margem a
desconfianças mais do que justificadas. Elas são reforçadas pelo caráter
patrimonialista da população, que segundo pesquisas disponíveis ama um
Estado forte, sugerindo uma "capitalismofobia" meio atávica.
Estando estabelecida a barra moral dos dias de hoje em algum círculo
dantesco, caberá a Doria e aos empresários fazerem tudo direito para
convencer a população sobre a funcionalidade dessa "PPP". E saber
embalar o produto para consumo do eleitor em plena vigência da Lava
Jato, algo complexo.
O teste está em curso agora, em São Paulo. Obviamente, Doria precisa
mostrar serviço além de ações de marketing, de se vestir disso ou
daquilo. Se ao fim tiver sucesso na redução das filas de exames da rede
de saúde, terá um trunfo importante. A ação das creches, também. Uma
cereja eventual para o bolo seria a revitalização funcional da
cracolândia, embora um passeio na região no centro de São Paulo
desestimule expectativas favoráveis.
Conseguir fazer uma gestão bem avaliada, opinam aliados mais otimistas,
lhe dará argumentos para ficar onde está ou buscar voos mais altos. A
Presidência, dizem, só será opção se Alckmin estiver muito ferido pela
Lava Jato ou pesado demais nas pesquisas. No caso de o governador estar
em forma e a cantada fritura do senador Aécio Neves (PSDB-MG) na chapa
do ministro Edson Fachin ocorrer, sempre haverá a busca pelo
Bandeirantes ou seguir na própria cadeira.
No xadrez interno tucano, Doria tem uma vantagem semelhante à de
Alckmin: distância respeitosa do governo de Michel Temer (PMDB).
Recentemente, o prefeito criticou a ideia de deixar a reforma
previdenciária de Estados e municípios para um segundo momento. Não
bastassem os problemas na Lava Jato, Aécio e o senador José Serra
(PSDB-SP), por sua vez, pregaram adesão orgânica a Temer desde o
impeachment de Dilma, e correm riscos que vão da cassação do presidente
pelo TSE ao pântano da impopularidade por tabela.
Por fim, o prefeito segue surfando a onda do antipetismo que varre São
Paulo desde 2014 e espraiou-se em 2016 pelo país. Vem ocupando espaço
enquanto outros líderes tucanos mantêm a fleuma: chamou Lula de "cara de pau" e protagonizou uma troca de farpas pública com Ciro Gomes.
O ora pedetista busca viabilizar sua terceira campanha presidencial
contando com a desistência ou impedimento legal do líder petista, e seu
apoio, além de carregar o ativo de não estar citado na Lava Jato.
Cabe notar que o antipetismo ganhou pé no Nordeste, ainda um reduto de
Lula, com a ascensão do prefeito de Salvador, ACM Neto (DEM). Não é
casual a citação a seu nome como vice do campo conservador em 2018.
O jogo pode estar no começo, mas está em pleno curso.
extraídderota2014blogspot
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