EDITORIAL GAZETA DO POVO - PR
Já depois da ordem de prisão, o presidente da Câmara dos Deputados, Rodrigo Maia, afirmou que “aqueles que têm responsabilidade pública, em qualquer nação, não podem celebrar a ordem de prisão de um ex-presidente da República”. Geraldo Alckmin, ex-governador de São Paulo e pré-candidato tucano à Presidência, disse que “é lamentável ver a decretação da prisão de um ex-presidente”. Mas, enfim, o que há para lamentar e o que há para celebrar? Em que medida a condenação de Lula “mancha a imagem do país”?
A condenação e a prisão de Lula são “lamentáveis” porque são evidência acachapante de que a rapinagem prospera nos mais altos escalões do governo
Há muito, sim, para lamentar. O fato de alguém ter usado o mais alto cargo do país para promover negociatas e enormes esquemas de corrupção, ainda mais quando o objetivo é fraudar a democracia para conseguir a perpetuação de um projeto de poder partidário, é profundamente lamentável. E, para alguém como um presidente (ou ex-presidente) da República agir dessa forma, mesmo sendo o centro das atenções em um país, é preciso ter um profundo desprezo pela Justiça e pelas instituições responsáveis pela investigação criminal. Desprezo este que consiste em considerá-las incapazes – por incompetência ou, pior, por cumplicidade – de alcançar os envolvidos e, especialmente, os chefes dos esquemas de corrupção. Que o detentor do cargo mais importante do país despreze dessa forma as instituições democráticas também é lamentável. E apenas nesse sentido se pode dizer que a condenação e a prisão de Lula são “lamentáveis”: porque elas são evidência acachapante de que a rapinagem prospera mesmo nos mais altos escalões do governo.
E também há muito para celebrar, a começar pelo fato de um corrupto condenado finalmente estar sendo punido – o que, aliás, deveria ser o destino natural de qualquer criminoso. Especialmente quando esse corrupto é um ex-presidente da República, ou seja, uma pessoa poderosa e influente, o tipo de pessoa que, algum tempo atrás, seria praticamente intocável em nossa República altamente personalista. Ninguém está pretendendo que a prisão de Lula seja o divisor de águas a partir do qual a corrupção está extinta no Brasil, mas não se pode negar que ela é um sinal potente de que estamos evoluindo para um país onde a lei efetivamente vale para todos.
Nossa imagem sai manchada com Lula na cadeia? É quase certo que não. Alguém diria que a imagem da França saiu manchada quando o ex-presidente Nicolas Sarkozy foi preso – ainda que temporariamente – não uma, mas duas vezes, em 2014 e em 2018, respectivamente por tráfico de influência e por ter recebido financiamento ilegal do ditador líbio Muamar Kadafi durante uma campanha eleitoral? Ou que a imagem de Portugal foi arranhada quando o ex-primeiro-ministro José Sócrates foi preso por corrupção, fraude fiscal, lavagem de dinheiro e tráfico de influência? Na Coreia do Sul, a ex-presidente Park Geun-hye acabou de ser condenada a 24 anos de prisão por corrupção – e, antes dela, dois ex-chefes de Estado daquele país já tinham sido presos pelo mesmo motivo, na década de 90. O ex-premiê Silvio Berlusconi coleciona condenações judiciais, e, se a Itália ainda é vista como um país marcado pela corrupção, isso ocorre apesar das condenações, não por causa delas. O que suja um país é a roubalheira que termina em pizza, não a punição dos ladrões. Manchados estaríamos se, depois de todas as evidências apresentadas ao longo destes anos, Lula seguisse impune.
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