Rogério Furquim Werneck: O Globo
Que não seria fácil, já se sabia. O que não se sabia era que, já a esta
altura, há três semanas da posse, o novo governo estaria às voltas com
embaraços tão sérios emanados da Lava-Jato.
O Planalto iniciou a penúltima semana de maio, encurtada pelo feriado de
Corpus Christi, determinado a testar o poder de fogo da sua base
parlamentar, conclamado-a a aprovar, a toque de caixa e sob ferrenha
resistência da oposição, a nova meta fiscal deste ano. Mas, quando a
meta foi afinal aprovada, ao fim de longa e tumultuada sessão conjunta
do Congresso, na madrugada da quarta-feira, 26/5, não havia mais clima
para comemoração.
Já na segunda-feira, 24/5, a “Folha de S.Paulo” iniciara a publicação de
uma série devastadora de transcrições de gravações de conversas
bilaterais do ex-presidente da Transpetro Sérgio Machado com os
senadores Romero Jucá, Renan Calheiros e José Sarney, sobre a
necessidade da promoção de um acordo político para “estancar a sangria”
da Operação Lava-Jato. E o pior é que ainda nem mesmo se sabe o que
mais, além dessas gravações, consta das temidas delações premiadas de
Sérgio Machado e de seu filho, recém-homologadas pelo ministro Teori
Zavascki, do Supremo Tribunal Federal.
A primeira baixa foi Romero Jucá. Caiu na própria segunda-feira,
obrigando o governo a desmontar a aposta que fizera na possibilidade de
facilitar a articulação entre a equipe econômica e o Congresso, ao
nomear para o Planejamento um senador com bom trânsito na base
governista.
Mas, para o governo, os danos potenciais prometem ser bem mais sérios.
Afinal, os outros dois senadores diretamente afetados não poderiam ser
mais proeminentes. Nada menos que o presidente do Senado e um
ex-presidente da República. Cardeais de alto coturno no PMDB e peças
cruciais na delicada manutenção do apoio do governo no Senado.
Não custa lembrar que Temer ainda tem pela frente o desafio de garantir
que dois terços dos senadores encerrem a interinidade do seu mandato,
com a confirmação do impeachment da presidente Dilma. E que a oposição
não abandonou a esperança de que, entre os senadores que votaram a favor
da admissibilidade sem explicitar posição definitiva a favor do
impeachment, ainda possa haver quem se disponha a votar contra o
afastamento definitivo da presidente.
É fácil perceber quão mais complexo ficará tal desafio se três senadores
da importância de Renan, Sarney e Jucá passarem a pautar sua atuação
pela estrita preocupação de salvar as próprias peles. Não
necessariamente isso redundará na volta de Dilma ao Planalto. Mas é bem
provável que, nesse cenário, Temer se torne refém do Senado e se
defronte com a exigência de um resgate proibitivo para se manter na
Presidência.
Antes que se chegue a tamanho entalo, contudo, vale a pena tentar
vislumbrar como, de imediato, os desdobramentos da crise que se instalou
no Senado podem afetar a condução da política econômica do governo
Temer. Nos últimos dias, houve quem tentasse se agarrar à ideia de que,
na verdade, Sérgio Machado teria prestado um favor a Temer, ao
enfraquecer a cúpula do PMDB no Senado.
A alegação traz à mente a menção feita por Fernando Henrique Cardoso,
nas suas memórias, à conjectura de que a viabilização do Plano Real
teria sido facilitada pelo enfraquecimento do Congresso em 1993, na
esteira do desgastante escândalo dos Anões do Orçamento.
É pouco provável, no entanto, que se possa observar efeito similar no
quadro atual, seja porque a implementação do programa econômico
vislumbrado pelo governo é agora muito mais dependente do apoio do
Congresso, seja porque o formato do escândalo é totalmente distinto. Os
que agora estão na linha de tiro são figuras que ocupam posições de proa
no Senado e na cúpula do partido do presidente da República.
Nesse terreno movediço, não será surpreendente se, em face das
incertezas decorrentes da crise precipitada por Sérgio Machado, Temer
ficar tentado a adiar a tramitação de medidas mais polêmicas no
Congresso para depois da batalha final do impeachment.
EXTRAÍDADEROTA2014BLOGSPOT
0 comments:
Postar um comentário