José Paulo Kupfer: O Globo
Com a surpresa da queda de “apenas" 0,3% do PIB no primeiro trimestre de
2016, em relação ao trimestre anterior — o mercado apostava em retração
de 0,8%, na média das estimativas —, teve início um processo de revisão
das taxas esperadas para os próximos trimestres. Nada ainda muito
diferente do que se projetava antes, mas o recuo de 4%, tido
anteriormente como piso do resultado final do ano, agora está sendo
apontado como um teto. Para 2017, muitas das apostas, a partir do PIB do
primeiro trimestre, dobraram. Já há quem projete crescimento de até
2,5% e a média das previsões pulou para algum número em torno de 1,5% de
expansão.
O espaço que levou ao erro de previsão no passado recente é o mesmo que
permite chutes mais otimistas para o futuro próximo. É uma zona
cinzenta, localizada na fronteira por definição pouco nítida do início
de uma reversão de tendência. Quando uma trajetória de alta passa a
refluir ou na hora em que a atividade econômica se aproxima do fundo do
poço e começa a mudar de direção, os sinais são difusos e costumam
apontar em direções opostas. Difícil captar, nesses momentos, o sentido
predominante do movimento e, em consequência, a tendência que vai
prevalecer.
Desde fins de 2015 e com mais disseminação a partir de fevereiro,
pode-se encontrar indícios de que a economia está se aproximando do
fundo do poço. Essas indicações ainda não são suficientes, contudo, para
apontar uma direção segura e sem volta de melhora da atividade
econômica.
Inexiste, por exemplo, consenso entre as projeções conhecidas sobre o
comportamento da economia no segundo trimestre, com previsões tanto de
continuidade da redução no ritmo de queda quanto de um repique de
retração. De todo modo, é possível encontrar, a partir do segundo
semestre, convergência em relação ao sentido da tendência, que é o de
retrações menos intensas a cada trimestre, até a virada para o terreno
positivo entre fins deste ano e início do próximo.
Podem-se listar, ao gosto do freguês, variados fatores favoráveis a uma
eventual retomada e enumerar, ao lado deles, inúmeros elementos capazes
de atrasar esse movimento. A verdade é que, por enquanto, os sinais de
proximidade do início da reversão obedecem muito mais à natureza cíclica
do fenômeno econômico do que a alguma suposta reação a ações de
política econômica. Os atuais e ainda dispersos indícios de virada se
devem ao simples fato de que a economia parece estar adentrando a camada
de pré-sal das profundezas recessivas.
Sim, a inflação, depois dos pesados ajustes, em 2015, nos preços
administrados e na taxa de câmbio, começou a ceder, empurrada pela
fraqueza da demanda. Isso, sem dúvida, pode abrir um caminho para cortes
nas taxas de juros, capazes de impulsionar a ocupação da ampla
capacidade ociosa existente, incluindo a mão de obra excedente produzida
pelo desemprego.
Mas, e a perspectiva de elevação nos juros americanos pelo Federal
Reserve, que dificultaria baixar os juros internos e blindar o real de
desvalorizações mais intensas, afetando a inflação? E, além disso, qual o
efeito da inadimplência ainda em alta, sobretudo em cenário de
desemprego elevado, comprometendo uma renda cadente e atrapalhando o
retorno da demanda? Ou as incertezas políticas, em meio a grampos e
delações, das quais decorrem, entre outros, riscos de desfiguração das
polêmicas propostas de ajuste fiscal anunciadas pelo governo interino?
Longe de esgotar os fatores favoráveis e desfavoráveis à reversão da
prolongada e acentuada contração da economia, essas poucas indagações
são suficientes para mostrar que, se a retomada é certa — tão certa
quanto a descida da ladeira depois do próximo pico de expansão —,
determinar quando exatamente ela vai tomar impulso e se consolidar ainda
se prende mais a algo do campo das crenças e desejos. Para dizer o
mínimo, são muitas as questões que continuam em aberto.
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