Carlos Newton
O presidente da Câmara dos Deputados, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), protocolou nesta segunda-feira os recursos às liminares concedidas pelos ministros Teori Zavascki e Rosa Weber, na semana passada, barrando temporariamente no Supremo Tribunal Federal o rito de tramitação do processo de impeachment da presidente Dilma Rousseff.
A decisão dos dois ministros deu novo ânimo ao governo, mas teve também efeito contrário, ao colocar em debate na Justiça o afastamento da presidente da República, antes mesmo de o pedido de abertura de processo seja aceito pela presidência da Câmara. Agora, ninguém mais pode ter dúvidas de que a possibilidade de impeachment realmente existe.
Não é comum que ministro do Supremo erre em concessão de liminar, mas de vez em quando acontece. Desta vez, a mancada foi dupla, envolvendo dois ministros que se basearam na falsa premissa ardilosamente que fundamentou os mandatos de segurança apresentados por quatro deputados governistas. Os parlamentares alegaram que a presidência da Câmara, em conluio com a oposição, havia criado um rito especial que facilitaria o impeachment da presidente Dilma Rousseff. Os ministros do Supremo confiaram na suposta idoneidade dos parlamentares (três do PT e um do PCdoB), ficaram alarmados com a gravidade da denúncia e concederam imediatamente as liminares, sem ouvir a Mesa da Câmara (“inaudita altera parte”, como dizem os juristas).
Certamente, Teori Zavascki e Rosa Weber jamais imaginariam que os deputados Wadih Damous (PT-RJ), Rubens Pereira(PCdoB-MA), Paulo Teixeira (PT-SP) e Paulo Pimenta (PT-RS) tivessem a desfaçatez de apresentar ao Supremo recursos forjados em fundamentação jurídica inexistente. Os dois ministros, é claro, agora devem estar arrependidos e envergonhados de terem sido usados com objetivos meramente políticos, no mau sentido.
A HISTÓRIA DO RITO
Nenhum presidente da Câmara tem poderes para criar ritos; trata-se de prerrogativa exclusiva do plenário, que é soberano. O rito atual, que os parlamentares governistas alegaram ao Supremo ter sido criado por Eduardo Cunha e pela oposição, na verdade está em vigor desde 1989, quando foi aprovado o atual Regimento Interno da Câmara, que tem força de lei e só pode ser discutido pelo Supremo em situação de flagrante inconstitucionalidade, o que não é o caso.
A Lei do Impeachment (1.079, de 1950) em nenhum momento teve seus termos desrespeitados pelo rito da Câmara, que já foi usado duas vezes – no impeachment de Collor e na tentativa de impeachment de Fernando Henrique Cardoso, quando o PT discordou da decisão do então presidente da Câmara, Michel Temer, e recorreu ao plenário, mas foi derrotado, com a maioria dos deputados confirmando a recusa do impeachment de FHC.
Se tivessem lido o Regimento da Câmara e consultado a jurisprudência do próprio Supremo, jamais os ministros Zavascki e Weber teriam deferido as liminares dos ardilosos deputados governistas – um deles é ex-presidente da OAB no Rio de Janeiro, vejam a que ponto chegou a decadência de nossas instituições.
JURISPRUDÊNCIA DO STF
A jurisprudência do Supremo é clara: o Supremo não tem poderes para aceitar recurso contra decisão da Câmara, conforme determina a seguinte ementa, enviada pelo comentarista Ednei Freitas, que honra a Tribuna da Internet com sua participação diária:
Processo: MS-AgR 26062 DF
Relator(a): GILMAR MENDES
Julgamento: 10/03/2008
Órgão Julgador: Tribunal Pleno
Publicação: DJe-060 Divulg 03-04-2008 Public 04-04-2008 Ement vol-02313-03 PP-00469
Parte(s): LUÍS CARLOS CREMA
e PRESIDENTE DA CÂMARA DOS DEPUTADOS
EMENTA:
1. Agravo Regimental em Mandado de Segurança.
- Oferecimento de denúncia por qualquer cidadão imputando
crime de responsabilidade ao Presidente da República (artigo 218 do
Regimento Interno da Câmara dos Deputados).
- Impossibilidade de interposição de recurso contra decisão que negou seguimento à denúncia. Ausência de previsão legal (Lei 1.079/50).
- A interpretação e a aplicação do Regimento Interno da Câmara dos Deputados constituem matéria interna corporis, insuscetível de apreciação pelo Poder Judiciário.
- Agravo regimental improvido.
Mesmo sem conhecer os termos da defesa apresentada ao Supremo pela Mesa da Câmara, é fácil constatar que os mandados de segurança dos quatro deputados governistas serão rejeitados, restabelecendo-se a independência dos poderes, sem a qual não existe democracia.
Ou seja, o impeachment de Dilma Rousseff vai tramitar obedecendo ao mesmo rito dos casos de Collor e FHC, com o presidente da Câmara aceitando ou não o pedido, cabendo recurso ao plenário, que é soberano em todas as decisões da Casa. Se for aceito o impeachment na Câmara, o processo então segue para o Senado, onde vai obedecer ao respectivo Regimento Interno, com o detalhe de o julgamento final ser comandado pelo presidente do Supremo, no caso, o ministro Ricardo Lewandowski. E estamos conversados.
EXTRAÍDADETRIBUNADAINTERNET





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