Diálogos banais na cena do crime - MARTHA MEDEIROS
Com licença, seu moço, preciso passar com minhas compras.
– Pois não, senhora, desculpe estar ocupando a calçada, é que tenho algo a dizer aqui para o parceiro que está me filmando com o celular.
– Fique à vontade, mas o senhor está com as palmas das mãos muito vermelhas, reparou?
– Eu sei, eu sei, é que tive um probleminha ali do outro lado da rua.
– Ei, você está vendo um homem deitado no meio do asfalto? – Pois é, talvez tenha sido atropelado, não sei, você viu alguma coisa?
– Não vi, mas parece que aquela moça loira viu, e até gravou. – Então deixa eu seguir para o escritório que estou atrasado, depois eu confiro no YouTube.
– Você não gostaria de me entregar essa faca, rapaz? – Da polícia você não é, madame.
– Não sou, mas ela logo chegará. – Demorou.
Nunca vi essa rua tão animada.
– É mesmo?
– Você não é aqui da vizinhança?
– Sou turista, parei para tirar umas fotos da performance. É uma performance, não é?
– Droga, meu celular está ficando sem bateria. – Use o meu. Quer fazer uma ligação?
– Gostaria apenas de filmar aqueles dois malucos ali com as mãos pingando sangue.
– E o cara deitado, sabe quem é? – Não, mas podemos tirar uma foto do rosto dele e colocar no Face pra ver se alguém identifica.
– Tá bom, tira a foto enquanto eu vou ali na esquina tentar alcançar um camarada que vi passar, ele está me devendo umas libras.
– Mãe, o que é que está acontecendo? – Um moço passou mal, filho. Vamos andando. – Acho que ele foi assassinado, mãe. Por aqueles dois batendo papo ali, ó.
– É, pode ser, filho. Você pegou seu caderno de matemática?
– Olho por olho, dente por dente, vocês matam meu povo, eu mato o de vocês.
– Faz sentido, faz sentido. Por favor, pode dar dois passinhos para a esquerda para eu enquadrar melhor?
– Aqui está bom?
– Está, agora deixe bem à vista a faca e o cutelo. Isso. Perfeito.
– Olha a polícia aí chegando. – Nossa, que estressados. – Alô. – Falo com a esposa do soldado Lee Rigby?
– Sim. – Boa tarde. É que aconteceu um inconveniente.
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