Dirceu tem direito de não gostar de sua condenação, mas não de ofender o Supremo. Será que, além de condenado por corrupção ativa e formação de quadrilha, ele quer ser enquadrado por crime de desacato?
Condenado pelo Supremo Tribunal Federal a uma pena de 10 anos e 10
meses de cadeia por corrupção ativa e formação de quadrilha ou bando, o
ex-chefe da Casa Civil José Dirceu protestou — é um direito seu — em texto publicado em seu blog, no qual assegura que dedicou “a vida” ao país, ao PT e “à luta pela democracia”. ...
Como contemporâneo de Dirceu inclusive no movimento estudantil, não me
lembro nada de ele querer na época uma “democracia burguesa” que, como
tantos dirigentes estudantis naquele tempo, abertamente desprezava, e
que o PT continou desprezando durante muito tempo — sem contar os que,
dentro do PT, ainda o fazem.
Mas vamos em frente. Mais adiante, na nota, diz o ex-ministro e ex-deputado:
“Fui cassado pela Câmara dos Deputados e, agora, condenado pelo Supremo Tribunal Federal sem provas porque sou inocente.
A pena de 10 anos e 10 meses que a suprema corte me impôs só agrava a
infâmia e a ignomínia de todo esse processo, que recorreu a recursos
jurídicos que violam abertamente nossa Constituição e o Estado
Democrático de Direito, como a teoria do domínio do fato, a condenação
sem ato de ofício, o desprezo à presunção de inocência e o abandono de
jurisprudência que beneficia os réus.
Um julgamento realizado sob a pressão da mídia e marcado para coincidir
com o período eleitoral na vã esperança de derrotar o PT e seus
candidatos.”
Não vejo como esse texto possa ser interpretado como não incluindo o
Supremo na “infâmia” e na “ignomínia”, a que se somam as graves
acusações de que o tribunal agiu ao arrepio da Constituição e da lei,
além do mais curvando-se à imprensa e, por fim, fazendo o julgamento
coincidir de propósito — com fins obviamente escusos — com a campanha
eleitoral.
O chamado jus espeneandi não concede a Dirceu, nem a ninguém, o
direito de ofender as instituições. Dirceu já passou dos limites em
relação à suprema corte mais de uma vez, e está na hora de seu
presidente, Ayres Britto, responder à altura — até porque foi ele,
ex-militantes do PT antes de vestir a toga, quem agendou, passo por
passo, o julgamento do mensalão para o período em que foi realizado.
Não satisfeito em ser condenado por dois crimes, Dirceu parece querer
tornar-se uma espécie de mártir do mensalão — incorrendo no crime
adicional de desacato (artigo 331 do Código Penal).
Fonte: Veja.com / Ricardo Setti -
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