editorial do Estadão
Uma recente pesquisa de intenção de votos para a Presidência, realizada pelo Datafolha, verificou que 31% dos eleitores que hoje votariam em Lula da Silva dizem que não escolherão nenhum outro candidato caso seu preferido não possa disputar a eleição. Com isso, ainda segundo essa pesquisa, chegaria a 36% o total de eleitores que votariam em branco ou anulariam o voto. Em simulações de segundo turno sem Lula, o vencedor, se a eleição fosse agora, teria o apoio de apenas um terço dos eleitores, de acordo com as projeções do Datafolha. Tais números bastaram para que ganhasse alguns adeptos a tese estapafúrdia, alardeada desde sempre pelos petistas, de que uma eleição sem o demiurgo de Garanhuns não teria “legitimidade” e que o ganhador de um pleito com essas características simplesmente não conseguiria governar, jogando o País no caos.
Tal raciocínio é capcioso em muitos aspectos e só se presta a defender o indefensável, isto é, que um criminoso condenado por corrupção possa disputar a eleição.
Não é difícil desmantelar essa cavilação. Em primeiro lugar, a eleição não é hoje, e não se sabe nem sequer quais serão os candidatos, cenário que se consolidará apenas no final do primeiro semestre. Isso significa que muitos eleitores só farão suas escolhas quando a campanha estiver nas ruas – e, como indicam as mais recentes eleições, essas escolhas acabam sendo feitas quase sempre a poucos dias do pleito. Portanto, o eleitor que hoje diz que não se dispõe a votar em ninguém que não seja Lula pode muito bem mudar de ideia.
Em segundo lugar, muitos dos que se apressam a denunciar a suposta ilegitimidade de uma eleição sem Lula dizem que os eleitores do petista consideram que seu candidato está sendo vítima de um Judiciário parcial. De acordo com essa análise, os juízes estariam interessados em punir, entre os acusados de corrupção, apenas os petistas, deixando os encalacrados de outros partidos livres para se candidatar. Ora, a mesma pesquisa citada como referência para sustentar esse argumento diz outra coisa, muito diferente: para 53% dos entrevistados, Lula deveria ser preso e, para 51%, não poderia disputar a eleição. Além disso, 59% entendem que o tratamento dispensado pela Justiça a Lula é melhor ou igual àquele que recebem os demais políticos. Quanto à velocidade da tramitação do processo de Lula na Justiça, considerada inusitadamente rápida por seus advogados – dando a entender que a suposta pressa serviria para alijar o petista da campanha o mais depressa possível –, os entrevistados na pesquisa têm outra opinião: para 53%, a Justiça trata o processo de Lula com igual ou menor rapidez do que a verificada nos processos relativos aos demais políticos. A esse propósito, sempre é bom lembrar, nessas horas de memória curta e seletiva, que o deputado cassado Eduardo Cunha e o ex-governador do Rio Sérgio Cabral, que não são petistas, estão atrás das grades há um bom tempo e o emedebista Geddel Vieira Lima está preso sem julgamento desde setembro do ano passado.
Por fim, mas não menos importante, a simples defesa da tese de que Lula deveria ser autorizado a participar das eleições, mesmo na condição de condenado por corrupção, ignora a exigência basilar para o bom funcionamento de um regime republicano: o respeito à lei. A menos que se considere que Lula foi julgado e condenado por tribunais de exceção, sem direito ao contraditório, como se aqui vigesse uma ditadura, as decisões dos juízes a respeito de seu caso devem ser acatadas.
Ou seja, Lula deve sofrer as sanções previstas na sentença e também na Lei da Ficha Limpa, onde se lê que condenados em segunda instância não podem disputar eleições. Qualquer argumento que ignore essas premissas é falso e, sobretudo, antidemocrático, pois pressupõe que, a depender das circunstâncias, há pessoas no Brasil para as quais a lei não se aplica. Aos que se dizem preocupados com a legitimidade de uma eleição sem Lula, é o caso de perguntar: que legitimidade teria um governo presidido por um corrupto condenado?
extraídaderota2014blogspot
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