EDITORIAL O ESTADÃO
Se as condições internacionais mudarem, o acesso ao financiamento ficará mais difícil, os fluxos de capital mudarão, o comércio global será prejudicado e as cotações dos produtos primários, muito importantes na pauta brasileira de exportações, serão quase certamente derrubadas.
Vários perigos foram invocados pelos especialistas para explicar a onda de preocupação nos mercados. Em vez de ser um fator de tranquilidade, a prosperidade americana, com vigoroso crescimento econômico e rápido aumento de empregos, foi incluída na conta dos sinais assustadores. Uma economia muito aquecida – é o argumento – será motivo para um aperto monetário mais forte. Os aumentos de juros pelo Federal Reserve, o banco central dos Estados Unidos, poderão ser quatro, neste ano, em vez dos três inicialmente previstos, segundo as especulações.
Segundo alguns analistas, a queda de cotações americanas na segunda-feira pode ter sido apenas o início de uma normalização dos mercados, depois de uma longa fase de valorização das ações. Isso pode ser verdade, mas o impulso de normalização pode perfeitamente combinar-se com os temores de uma reversão mais veloz da política monetária muito branda e expansionista.
O aquecimento da economia, no entanto, ocorre muito além das fronteiras americanas. O crescimento econômico na zona do euro tem sido maior que o previsto, disse na segunda-feira o presidente do Banco Central Europeu (BCE), Mario Draghi. A declaração foi feita em discurso no Parlamento Europeu. O pronunciamento foi positivo e otimista quanto às perspectivas de expansão dos negócios e de estabilidade financeira. Mas o sucesso da política monetária do BCE pode traduzir-se numa inflação mais próxima de 2% e, em seguida, no abandono gradual da estratégia expansionista. Se isso se combinar com um aperto mais acentuado nos Estados Unidos, a fase eufórica dos mercados deverá acabar. Um dos desdobramentos poderá ser um forte ajuste nos preços de alguns ativos, supervalorizados durante anos de dinheiro fácil. Empresas muito endividadas também poderão encontrar dificuldades.
Algumas dessas advertências têm sido repetidas há uns dois anos, ou pouco mais, por economistas de instituições multilaterais. Numa linguagem mais branda, dirigentes do Banco Central do Brasil vêm alertando para o risco de mudança de um cenário externo até agora descrito, várias vezes, como benigno.
O Brasil estará entre os países mais afetados por uma reversão do quadro internacional, se o aperto for razoavelmente forte. A segurança proporcionada por cerca de US$ 380 bilhões de reservas poderá ser muito limitada, a depender de quanto piore o humor de investidores e financiadores. Não há como duvidar da urgência de ajustes mais amplos. A reforma da Previdência deve ser a primeira medida. A chamada base governista será mais que suficiente para garantir essa reforma, se os seus parlamentares se dispuserem a cumprir as obrigações de legisladores. Os efeitos de uma nova crise serão muito duros, especialmente para os mais pobres e mais desprotegidos. Um parlamentar deve ser capaz de entender esse dado evidente.
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